domingo, 4 de novembro de 2007

Episódios e Meteoros - 55

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(crónica publicada desde anteontem no Expresso Online)
(ver também no meu blogue de crónicas)
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Philip Roth terminou o seu romance Casei com um comunista (1998) com uma frase lapidar: "As estrelas são indispensáveis".
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O comunismo mais ingénuo sempre sonhou, à moda dos místicos milenaristas, com um mundo perfeito. Longe dessa asa de cisne imaculada, ficava a barbárie, ou pelo menos a carne e o osso da realpolitik.
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Em todas as pessoas que foram, a pouco e pouco, abandonando o comboio de Marx e Lenine, é difícil disfarçar qual das duas costelas terá sido mais herdada. Se a ingénua, se a outra. Para não ir mais longe, olhemos para Pina Moura e para Isabel Pires de Lima. A diferença parece-me ser límpida e cristalina. E a conclusão óbvia.
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Quer isto dizer que, para a actual ministra da cultura, a frase de Roth há-de sempre ter soado muito bem. Daí que o deslumbre pelo Hermitage surja sem pecado, espelhando o desejo sempre frustrado de brincar a sério com bonecas idílicas de papier mâché.
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Afinal, o que era velha Rússia? Palácios infinitos, rendas preciosas, princesas lindas com borboletas a navegar na imaginação de príncipes estóicos; renas e mais renas, vastidões maravilhadas, ícones, tentações de sangue e vozes de gelo. Tudo a velejar num barroco de cores pastel, mas celestial. Que paraíso antes sonhado e proibido poderia Isabel Pires de Lima ter agora libertado, a não ser este?
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Estive com Isabel Pires de Lima numa única e fugidia reunião. Éramos jurados diante da escolha de um entre vários livros. Gostei da senhora: sorria com candura e não tinha ainda os olhos espantados de Judy Garland ou o ímpeto sumptuoso de Audrey Hepburn. Salvo seja. Nem o cabelo com os dourados que teriam encantado Pierre-Philippe Thomire. Hoje, quando volto a vê-la na televisão como personagem e ministra, noto, de facto, que algo de muito profundo mudou. Algo tão humano, quanto uma velha paixão subitamente revivida nos crepúsculos do Haiti.
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É por isso que deprecio, ou seja, que não levo muito a sério os habituais protestos do mundo cultural que quereriam ver o dinheirinho do orçamento nos seus próprios cofres e que nos vêm falar em "fait-divers de programação cultural" ou em "apequenar os museus portugueses".
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Deixem brilhar as estrelas!