quarta-feira, 2 de maio de 2007

Escavações Contemporâneas - 2


LCA
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O sorriso do arquivo no tempo da rede
(hoje: Viriato Soromenho Marques)
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"1.NAÇÕES IMAGINÁRIAS (21/01/1999)
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O mundo, e em particular a Europa, vivem hoje sob a sombra do que parece ser um dos mais difíceis paradoxos do nosso tempo. Os sinais, entre outros, são os seguintes:
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No Kosovo, albaneses e sérvios prosseguem num massacre intempestivo e cruel, que partindo dos confins da história, ameaça tornar-se num conflito regional de proporções incertas.
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A União Europeia avança para a moeda única, mas as divisões nacionais, e a transformação da Alemanha num país 'normal' (que defende o seu egoísmo nacional com a firmeza de todos os outros) tornam quase impossível uma Agenda 2000 favorável à coesão económico-social, e estiveram à beira de deixar a União sem a sua Comissão, o mais imparcial e menos 'nacional' dos seus órgãos.
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No Brasil, o velho Ítamar Franco, candidato presidencial falhado, ao não pagar as dívidas do Estado de Minas Gerais aos cofres federais coloca o Brasil à beira da ruptura e lança as bolsas do mundo inteiro numa vertigem depressiva.
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Em Angola, a hora da paz, conseguida com tantos esforços e tantas vítimas, deu outra vez lugar à guerra aberta, com exércitos que falam português combatendo em ambos os lados da barricada.
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Qual é o verdadeiro paradoxo jazendo sob estes fenómenos, dispersos pelos quatro cantos do mundo?
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Por um lado, quando se perspectivam os grandes problemas e interrogações do futuro conjugamos, cada vez mais inevitavelmente, o difícil verbo GLOBALIZAR.
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Por outro lado, quando se procuram as forças e os sujeitos capazes de se tornarem nos protagonistas do futuro, vislumbramos os Estados, os Povos, os Indivíduos continuarem prisioneiros de velhos dilemas, angústias e ódios associados ao problema da identidade nacional.
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Quando pensamos nos grandes problemas da economia, do comércio, do ambiente, da guerra e da paz, voltamo-nos, sem outro recurso, para o horizonte do diálogo, dos compromissos e das instituições internacionais e supranacionais...
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No entanto, quando confrontados com a urgência desses desafios, próprios de um planeta em acelerada transição, refugiamo-nos, talvez defensivamente, na aparente segurança dos valores nacionais.
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Esquecemo-nos, porventura, que a própria formação da Nação e da consciência nacional não constituiu uma dádiva da Natureza, tendo sido antes o fruto de um trabalho altamente complexo de construção e sedimentação históricas.
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Os Estados-Nação, consolidados sobretudo no século XIX, correspondiam, também eles, à necessidade de responder a tarefas que já não poderiam ser enfrentadas a uma escala espacial e organicamente inferior.
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O que significa ser-se hoje, nesta viragem de milénio, um nacionalista? Até que ponto e em que medida é compatível a preservação da identidade nacional com a urgência das novas tarefas globais? É possível uma posição nacionalista que não se afirme à custa da lógica da exclusão e do desrespeito pelos direitos humanos universais? O que é que existe de estrutural e de simplesmente conjuntural na presente vaga de nacionalismos?
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Estas são algumas das perguntas que entrarão, inevitavelmente, na agenda política do século XXI. Um século em que teremos de aprender a estender o nosso patriotismo às fronteiras do mundo inteiro. Um século em que, quase inevitavelmente, teremos de escolher entre sermos cosmopolitas, cidadãos o mundo, ou abrirmos as portas ao caos e à catástrofe do sistema internacional."