José Vegar, Serviços Secretos Portugueses - História e poder da espionagem nacional, A Esfera dos Livros, Lisboa (lançamento, hoje, na FNAC do Cascaishopping, 21.30h, com Anabela Mota Ribeiro).
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Pré-Publicação:
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"A máquina de investigação portuguesa comete alguns dos pecados capitais do ofício, nomeadamente os da dependência, da conflitualidade de competências, da reactividade, da fragmentação e da não associação com entidades exteriores ao sistema.
Em relação à dependência, esta agravou-se nos últimos anos, a partir do momento em que as associações criminosas começaram a usar a seu favor a globalização, e o terrorismo não local se manifestou.
A dependência informativa dos serviços portugueses em relação aos seus congéneres, e aos organismos supranacionais, é actualmente enorme, seguindo uma tendência comum em toda a União Europeia. Aliás, a UE aprovou recentemente o princípio da disponibilidade, que consagra, a partir de 1 de Janeiro de 2008, a obrigatoriedade de todos os estados membros disponibilizarem – através de acesso directo às informações, por bases de dados interligadas, e acesso indirecto, por pedido específico – os seus dados a qualquer investigador policial ou de espionagem, que deles necessite. A medida é aparentemente positiva, porque reforça a indispensável cooperação global, mas não deixa de agravar a dependência dos serviços dos países com pouca capacidade de pesquisa directa, onde se inclui Portugal, daqueles que ainda a mantêm, como é o caso dos ingleses e dos franceses.
A conflitualidade de competências, que produz a competição negativa pela obtenção do saber, e a sua dispersão depois de obtido, dá matéria para um interminável ensaio, dada a extrema complexidade do sistema português, um misto de caos estatal balcânico e da infinidade de bureaux públicos da república francesa nos anos 801.
No fundo, o problema tem origem no facto de todas as entidades do sistema se concentrarem no mesmo tipo de alvos e na mesma dimensão da realidade, salvo raras excepções, procurando, entre outros desígnios, executar o melhor possível a sua missão, mas também, simultaneamente, obter o máximo de controlo da área de segurança nacional."
Em relação à dependência, esta agravou-se nos últimos anos, a partir do momento em que as associações criminosas começaram a usar a seu favor a globalização, e o terrorismo não local se manifestou.
A dependência informativa dos serviços portugueses em relação aos seus congéneres, e aos organismos supranacionais, é actualmente enorme, seguindo uma tendência comum em toda a União Europeia. Aliás, a UE aprovou recentemente o princípio da disponibilidade, que consagra, a partir de 1 de Janeiro de 2008, a obrigatoriedade de todos os estados membros disponibilizarem – através de acesso directo às informações, por bases de dados interligadas, e acesso indirecto, por pedido específico – os seus dados a qualquer investigador policial ou de espionagem, que deles necessite. A medida é aparentemente positiva, porque reforça a indispensável cooperação global, mas não deixa de agravar a dependência dos serviços dos países com pouca capacidade de pesquisa directa, onde se inclui Portugal, daqueles que ainda a mantêm, como é o caso dos ingleses e dos franceses.
A conflitualidade de competências, que produz a competição negativa pela obtenção do saber, e a sua dispersão depois de obtido, dá matéria para um interminável ensaio, dada a extrema complexidade do sistema português, um misto de caos estatal balcânico e da infinidade de bureaux públicos da república francesa nos anos 801.
No fundo, o problema tem origem no facto de todas as entidades do sistema se concentrarem no mesmo tipo de alvos e na mesma dimensão da realidade, salvo raras excepções, procurando, entre outros desígnios, executar o melhor possível a sua missão, mas também, simultaneamente, obter o máximo de controlo da área de segurança nacional."
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"Como é razoável concluir pelo que foi exposto, os serviços de espionagem portugueses enfrentam, num futuro próximo, um sério desafio para justificarem a sua existência. Objectivamente, a pesquisa interna pode ser feita pelas polícias, e a pesquisa externa por diplomatas e militares. A análise, talhada a partir dos exemplos internacionais mais recentes, pode ser executada por uma entidade de especialistas, com um efectivo relativamente reduzido, acesso a toda a informação obtida, e ligação directa aos decisores. Aliás, a reorganização recente da estrutura dependente do secretário-geral de Informações é uma tentativa tímida, e com uma configuração muito portuguesa, neste sentido.
No entanto, é extremamente hipócrita e redutor apresentar o problema nacional como estando relacionado apenas com os serviços de espionagem. O que está verdadeiramente em causa, há mais de uma década, é todo o sistema de segurança nacional de Portugal. Realmente, ao campo da pesquisa e da análise, interna e externa, deve-se juntar o universo militar e das operações especiais, também estes contaminados pelos mesmos problemas de duplicação de competências, competição de objectivos, e replicação de objectivos de trabalho.
O que acontece desde 1984, perante a passividade dos sucessivos governos, é que cada uma das entidades envolvidas, sabendo com a lucidez provocada pela realidade do terreno que os seus métodos e poderes são diariamente ultrapassados pelos alvos que perseguem, procura sofisticar esses mesmos métodos, obter mais recursos e alargar as suas competências, gerando uma máquina sem controlo, e, principalmente, sem comando estratégico.
A reforma do aparelho está por demais diagnosticada, e saber qual é o modelo adequado para o fazer funcionar é verdadeiramente uma questão secundária. A reforma exige uma reavaliação dos alvos, uma expressão clara e autoritária das especializações e competências, a abertura de canais efectivos de passagem da informação entre entidades, uma complementaridade e cooperação reais no trabalho exigido, e a criação de estruturas coordenadoras de comando e de recolha global e tratamento da informação. Assim sendo, obriga à eliminação de organismos, à retirada de competências, à passagem de saberes, e a adaptação dos vários grupos de profissionais da área a todo um novo modelo de funcionamento. Como é fácil de perceber, uma reforma deste tipo tem um alto preço político, que Governo algum até ao momento quis pagar.
O comodismo executivo seria facilmente aceitável por parte dos cidadãos noutra conjuntura geopolítica e de segurança nacional. Mas a verdade é que, queira ou não, o Estado português pertence a uma aliança política internacional que enfrenta ameaças reais, e que diariamente tenta encontrar as melhores armas para as enfrentar. Deste modo, os EUA e o Reino Unido desencadearam a maior reorganização dos seus aparelhos de segurança desde a Segunda Guerra Mundial, e The Economist garante que «a natureza, origem, análise e uso das informações nunca tiveram antes um papel tão central na política inglesa»1. Afinal, é tudo tão simples como a fórmula criada pelo perito americano Loch K. Johnson: «Numa paisagem estratégica infectada por ainda maiores incertezas, a necessidade de saber não só se mantém como cresceu2.»"
No entanto, é extremamente hipócrita e redutor apresentar o problema nacional como estando relacionado apenas com os serviços de espionagem. O que está verdadeiramente em causa, há mais de uma década, é todo o sistema de segurança nacional de Portugal. Realmente, ao campo da pesquisa e da análise, interna e externa, deve-se juntar o universo militar e das operações especiais, também estes contaminados pelos mesmos problemas de duplicação de competências, competição de objectivos, e replicação de objectivos de trabalho.
O que acontece desde 1984, perante a passividade dos sucessivos governos, é que cada uma das entidades envolvidas, sabendo com a lucidez provocada pela realidade do terreno que os seus métodos e poderes são diariamente ultrapassados pelos alvos que perseguem, procura sofisticar esses mesmos métodos, obter mais recursos e alargar as suas competências, gerando uma máquina sem controlo, e, principalmente, sem comando estratégico.
A reforma do aparelho está por demais diagnosticada, e saber qual é o modelo adequado para o fazer funcionar é verdadeiramente uma questão secundária. A reforma exige uma reavaliação dos alvos, uma expressão clara e autoritária das especializações e competências, a abertura de canais efectivos de passagem da informação entre entidades, uma complementaridade e cooperação reais no trabalho exigido, e a criação de estruturas coordenadoras de comando e de recolha global e tratamento da informação. Assim sendo, obriga à eliminação de organismos, à retirada de competências, à passagem de saberes, e a adaptação dos vários grupos de profissionais da área a todo um novo modelo de funcionamento. Como é fácil de perceber, uma reforma deste tipo tem um alto preço político, que Governo algum até ao momento quis pagar.
O comodismo executivo seria facilmente aceitável por parte dos cidadãos noutra conjuntura geopolítica e de segurança nacional. Mas a verdade é que, queira ou não, o Estado português pertence a uma aliança política internacional que enfrenta ameaças reais, e que diariamente tenta encontrar as melhores armas para as enfrentar. Deste modo, os EUA e o Reino Unido desencadearam a maior reorganização dos seus aparelhos de segurança desde a Segunda Guerra Mundial, e The Economist garante que «a natureza, origem, análise e uso das informações nunca tiveram antes um papel tão central na política inglesa»1. Afinal, é tudo tão simples como a fórmula criada pelo perito americano Loch K. Johnson: «Numa paisagem estratégica infectada por ainda maiores incertezas, a necessidade de saber não só se mantém como cresceu2.»"
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