sexta-feira, 12 de janeiro de 2007

O presságio de um fim

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A reportagem que ontem passou na 2 foi elucidativa e disse em voz alta o que muitos pensam mas não dizem, apesar de acreditarem que existe um novo tipo de guerra no mundo desde o 09/11. Nem sempre a televisão é uma caixa de passatempos inúteis, como se vê.
Ainda que seja sempre melhor sem Saddam, não deixa de ser evidente que o Iraque de hoje é um campo de guerra em que ninguém confia em ninguém: um monte de pó entre muros, alvenarias e cabanas; um grande mar de casas esburacadas e palmeiras onde vive um povo traumatizado, dividido, em guerra civil, sem qualquer segurança e permanentemente exposto ao ritmo das explosões, dos ataques inesperados, dos fanatismos religiosos e dos apetites dos terroristas.
A incompreensão entre culturas, o artificialismo das fronteiras, os desígnios cruzados, as pequenas vinganças, o cansaço político e as expectativas baixíssimas não auguram nada de bom. Qualquer pessoa com os pés na terra, ou seja, não alimentada pela doença infantil do anti-americanismo, pode constatar que este Iraque dificilmente evitará um destino no limiar do trágico.
Basta conhecer um pouco da história da região - desde o início do califado Abássida até ao advento Seldjúcida e depois Otomano, desaguando nas turbulências do século XX - para perceber que a ideia e a prática da democracia, tal como a entendemos, é algo que não está propriamente sujeito a uma espécie de Export-Import. As teocracias e as administrações de ferro sempre constituíram, no Iraque, os ecos reais do poder.
As últimas medidas anunciadas por Bush dificilmente deixarão de ser entendidas como denunciadas e até defensivas, na medida em que preparam o fim do mandato aumentando o ruído da voz de comando, radicalizam o caminho (fortemente minado) que conduz à futura campanha eleitoral e deixam assim a verdadeira “batata quente” ao sabor dos votos e dos imponderáveis do Outono de 2008.
Não sei se a expressão “fuga para a frente” se aplicará bem neste contexto, mas como
Andrew Sullivan referiu, os esforços anunciados por Bush poderão já ser tardios: “The only way it will work if we have the means to take on the Mahdi army and the Shia extremists with Maliki's backing and force the government to be more open to the Sunnis (something many of us doubt)”. Isto é: como um porta-aviões, que ninguém ousa baptizar com o nome de Teseu, perdido dentro do fio de Ariadne e à procura de uma saída francamente improvável.