quinta-feira, 30 de novembro de 2006

Mini-entrevistas - 68


LC
e
O Miniscente tem estado a publicar uma série de entrevistas acerca da blogosfera e dos seus impactos na vida específica dos próprios entrevistados. Hoje o convidado é Carlos Albino (http://notasverbais.blogspot.com/).
e
- O que é que lhe diz a palavra “blogosfera”
É o firmamento, na versão mais recente – por ora, firmamento corrigido e aumentado, como outrora o Dicionário do Torrinha corrigido e aumentado, aumentando-se os erros, supria biblicamente a falta de dicionários. Mas é um esplendoroso firmamento, com os seus buracos negros – é certo; com as suas gigantescas nebulosas – anónimas como todas; os seus asteróides desgovernados – que são avisos de quanto é efémera uma suposta ordem de opinião; enfim, e é o que mais interessa, com planetas em equilíbrio que não discutem a sua grandeza e aceitam como livre o seu caminho também efemeramente pré-determinado. Essa palavra da blogosfera diz-me precisamente este firmamento onde, em qualquer oportunidade, até Deus pode criar o seu blogue, fazendo-se homem. Já não direi o mesmo dos homens que se julgam deuses.
- Qual foi o acontecimento (nacional ou internacional) que mais intensamente seguiu apenas através de blogues?
Os blogues são tão só um meio a despontar e a descobrir a sua própria pauta, ou um instrumento de comunicação entre outros que o tempo há muito especializou, são a abertura do mundo para o comentário dos acontecimentos e dos factos - mesmo que apresentem um acontecimento ou, com autonomia, revelem um facto, apenas por erro de paralaxe, poder-se-á ver nisso concorrência ou substituição, muito menos excepção sediciosa contra outros meios. Penso, pois, ser impossível seguir um acontecimento “apenas” através de blogues. Mas seguir os acontecimentos ”também” através do directório de opiniões que já transformou a blogosfera em terra firme e até selecta em algumas áreas, é já um hábito adquirido, tanto quanto posso, quanto a acontecimentos dominantes ou que vão sendo dominantes. Sobretudo em áreas especializadas, os blogues ensinam-nos quanta verdade encerra aquele preceito de François Villon “conheço tudo, excepto a mim próprio”.
- Qual foi o maior impacto que os blogues tiveram na sua vida pessoal?
A descoberta e prova de que, por exemplo em Portugal, para além de um escol em formatura de pensamento e análise, há uma elite circunstancialmente gregária de análise e de pensamento – os termos por esta ordem, porque é por esta ordem efémera que se gera a Crítica, o Escrutínio. Além disso, a actualização da forma de escrever do velho escriba de rolos – enrolando, lá para o fundo, cada vez mais para o fundo, o que vai escrevendo longe da preocupação de, panorâmicamente numa página ou, para maior auto-satisfação, em duas páginas lado a lado, mostrar toda a sua verdade ou o mais possível da sua verdade. Neste caso, não é a escrita que impõe a verdade acabada (mesmo com as ressalvas académicas de pé de página, impossíveis nos rolos), é a forma de escrever que, já de si, ensina que nada é definitivo e que aquilo que ainda é visível, para ter visibilidade, não pode condescender com a falta de verdade, a ausência de paixão e, por tudo, com a desatenção pela modéstia. Um escriba sério jamais quererá ser o maior, mas apenas contribuir para que um rolo, o seu e o dos outros sérios, seja o mais comprido possível. Um blogue é uma máquina de ocultar o que se escreveu, sem esconder o que foi escrito. Outros meios não podem fazer isso, por natureza.
- Acredita que a blogosfera é uma forma de expressão editorialmente livre?
Pois quem estaria no primeiro firmamento da história humana em que dá para acreditar, se se sentisse censurado, pré-examinado ou interditado, sendo a interdição editorial a mais recente e capciosa fórmula de punir os outros por delito de opinião ou pelo delito de não seguir dicionários do Torrinha?
e
Entrevistas anteriores: Série I - Carlos Zorrinho, Jorge Reis-Sá, Nuno Magalhães, José Luís Peixoto, Carlos Pinto Coelho, José Quintela, Reginaldo de Almeida, Filipa Abecassis, Pedro Baganha, Hans van Wetering, Milton Ribeiro, José Alexandre Ramos, Paulo Tunhas, António Nunes Pereira, Fernando Negrão, Emanuel Vitorino, António M. Ferro, Francisco Curate, Ivone Ferreira, Luís Graça, Manuel Pedro Ferreira, Maria Augusta Babo, Luís Carloto Marques, Eduardo Côrte-real, Lúcia Encarnação, Paulo José Miranda, João Nasi Pereira, Susana Silva Leite, Isabel Rodrigues, Carlos Vilarinho, Cris Passinato, Fernanda Barrocas, Helena Roque, Maria Gabriela Rocha, Onésimo Almeida, Patrícia Gomes da Silva, José Carlos Abrantes, Paulo Pandjiarjian, Marcelo Bonvicino, Maria João Baltazar, Jorge Palinhos, Susana Santos, Miguel Martins, Manuel Pinto e Jorge Mangas Peña. Série II – Eduardo Pitta, Paulo Querido, Carlos Leone, Paulo Gorjão, Bruno Alves, José Bragança de Miranda, João Pereira Coutinho, José Pimentel Teixeira, Rititi, Rui Semblano, Altino Torres, José Pedro Pereira, Bruno Sena Martins, Paulo Pinto Mascarenhas, Tiago Barbosa Ribeiro, Ana Cláudia Vicente, Daniel Oliveira e Leandro Gejfinbein. Agenda desta semana (27/11/06 a 2/12/06): Isabel Goulão, Lutz Bruckelmann, Jorge Melícias, Carlos Albino, Rodrigo Adão da Fonseca e Tiago Mendes.