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No início dos anos oitenta, Richard Rorty afirmou: “há pessoas que escrevem como se só existissem textos”. Na blogosfera, fora talvez das vagas mais especializadas, esta tendência virtualizante apenas se acentuou. O mundo das escritas que se desdobram em escritas e das imagens que se desdobram em imagens tornou-se cada vez mais numa espécie de barómetro expressivo.
Ao navegar-se na rede, os sites e os blogues sucedem-se e a leitura, não estando fixa em lado nenhum, desloca-se sem aquele rumo que sempre nos habituou ao cumprimento de princípios, de fins, de direcções, de metas e de sentidos monopolizáveis. Ao contrário de uma possível História da Leitura Moderna, o texto subitamente mergulha no texto e dá-se a ver como uma auto-referência que avança em caminhos diferentes ao mesmo tempo (como se a sua montagem escapasse ao teor tradicional da manipulação griffithiana).
De um momento para o outro (uma década, hoje em dia, é um segundo), tal como em alguma arquitectura nórdica onde o encaixe dos materiais gera a robustez das linhas de força, também nesta escrita o sentido parece resultar mais do ímpeto com que o texto força e penetra no plano de outros textos e nas agendas que vai partilhando.
Aliás, neste movimento (nesta navegação), a escrita e a leitura parecem fundir-se como se dois filmes que se vissem frente a frente (ecrã face a ecrã), se misturassem e se projectassem caleidoscopicamente em todas as direcções.
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Há uma constante no modo como a escrita e a leitura blogosféricas traduzem esta intimidade com que os nós da rede se observam e interpenetram. Essa constante consiste na maior importância atribuída ao “quem” do que ao “quê” que emerge nos blogues (o que não acontece nos livros onde o enunciado tende a sobrepor-se quase sempre às enunciações, devido ao fôlego da narrativa tradicional). E isto apesar de o “quem” dos blogues corresponder quase sempre a um “eu” ficcional, cuja amplitude é ambígua: do intimismo confessional à tergiversação doméstica, do imediatismo crítico à crónica aforística, da locução apologética à proclamação solitária (longe de mim pretender categorizar!).
No rápido, persistente e ininterrupto dialogismo que faz dos blogues uma máquina agilíssima de vasos comunicantes, cada novo blogue que surge faz-se quase sempre acompanhar por uma atitude telegráfica que é menos apresentação do que explicação de si próprio. Trata-se de um ter que dizer “o quê” (de que se ocupa, ao que vem...) que “me faz ser assim como sou” (ou seja, que aponta para o sujeito empírico e ficcional que passo a ser - "o quem"). Como se um muro tivesse que explicar a forma que o faz ser muro. Como se um “quê” tivesse que se transformar subitamente num “quem” para poder aceder às regras do clube. É por isso que um blogue é sempre muito mais o blogue de “A” do que o blogue que versa “Y”.
Este facto, que releva a supremacia da individuação no novo meio, é afinal contíguo à citada máxima de Rorty. Como se o cenário da blogosfera tivesse voltado a emancipar todo o tipo de personagens, mas com um único propósito: escreverem e confundirem-se com os seus textos como se só existissem textos. Como se a leitura e a escrita se tivessem tornado de vez nesse novo filme sem fim (feito de filmes e de filmes de filmes) onde cada personagem - cada mónada - se move como se fizesse parte, realmente, de uma "segunda humanidade".
Ao navegar-se na rede, os sites e os blogues sucedem-se e a leitura, não estando fixa em lado nenhum, desloca-se sem aquele rumo que sempre nos habituou ao cumprimento de princípios, de fins, de direcções, de metas e de sentidos monopolizáveis. Ao contrário de uma possível História da Leitura Moderna, o texto subitamente mergulha no texto e dá-se a ver como uma auto-referência que avança em caminhos diferentes ao mesmo tempo (como se a sua montagem escapasse ao teor tradicional da manipulação griffithiana).
De um momento para o outro (uma década, hoje em dia, é um segundo), tal como em alguma arquitectura nórdica onde o encaixe dos materiais gera a robustez das linhas de força, também nesta escrita o sentido parece resultar mais do ímpeto com que o texto força e penetra no plano de outros textos e nas agendas que vai partilhando.
Aliás, neste movimento (nesta navegação), a escrita e a leitura parecem fundir-se como se dois filmes que se vissem frente a frente (ecrã face a ecrã), se misturassem e se projectassem caleidoscopicamente em todas as direcções.
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Há uma constante no modo como a escrita e a leitura blogosféricas traduzem esta intimidade com que os nós da rede se observam e interpenetram. Essa constante consiste na maior importância atribuída ao “quem” do que ao “quê” que emerge nos blogues (o que não acontece nos livros onde o enunciado tende a sobrepor-se quase sempre às enunciações, devido ao fôlego da narrativa tradicional). E isto apesar de o “quem” dos blogues corresponder quase sempre a um “eu” ficcional, cuja amplitude é ambígua: do intimismo confessional à tergiversação doméstica, do imediatismo crítico à crónica aforística, da locução apologética à proclamação solitária (longe de mim pretender categorizar!).
No rápido, persistente e ininterrupto dialogismo que faz dos blogues uma máquina agilíssima de vasos comunicantes, cada novo blogue que surge faz-se quase sempre acompanhar por uma atitude telegráfica que é menos apresentação do que explicação de si próprio. Trata-se de um ter que dizer “o quê” (de que se ocupa, ao que vem...) que “me faz ser assim como sou” (ou seja, que aponta para o sujeito empírico e ficcional que passo a ser - "o quem"). Como se um muro tivesse que explicar a forma que o faz ser muro. Como se um “quê” tivesse que se transformar subitamente num “quem” para poder aceder às regras do clube. É por isso que um blogue é sempre muito mais o blogue de “A” do que o blogue que versa “Y”.
Este facto, que releva a supremacia da individuação no novo meio, é afinal contíguo à citada máxima de Rorty. Como se o cenário da blogosfera tivesse voltado a emancipar todo o tipo de personagens, mas com um único propósito: escreverem e confundirem-se com os seus textos como se só existissem textos. Como se a leitura e a escrita se tivessem tornado de vez nesse novo filme sem fim (feito de filmes e de filmes de filmes) onde cada personagem - cada mónada - se move como se fizesse parte, realmente, de uma "segunda humanidade".