Vivi os primeiros catorze anos da minha vida em Évora e voltei a ter casa por cá há pouco mais de uma década. Mas nunca tinha visto neve nesta cidade. Hoje, no entanto, a manhã acordou branca, branquíssima. Nevou durante mais de três horas. Neste momento, o espectáculo recomeçou. Cai neve copiosamente. Farrapos largos e leves.
Temos andado pela rua de casacão, gorro e luvas - só o cão é que não achou piada à súbita voragem dos céus - e verificámos que as pessoas sorriam e comunicavam com uma extroversão rara. O Alentejo é austero nesse tipo de dádivas. Mas hoje o cenário e o contexto de hibernação alteraram-se. E logo o jogo plástico da cidade, as formas habitualmente cristalizadas e a tímida passividade das pessoas irradiaram de modo único. Continuo a olhar pelas vidraças do meu escritório (a parede virada a nascente é toda de vidro) e o panorama denota o dom de uma graça que vale a pena acolher com gáudio, com prazer e com serenidade.
Nos dez anos que vivi na Holanda isto era habitual. Uma das vistas mais belas que evoco na minha memória é a dos canais gelados repletos de crianças vestidas com cores muito vivas. Este domingo reabre essa chama antiga e fá-la comungar com o vislumbre. As fotografias estão a caminho (há algum trabalho técnico prévio a desenvolver. Até já!).