quarta-feira, 11 de janeiro de 2006

A espuma do apocalipse (actualizado)

Ontem, pela primeira vez - no Politécnico de Abrantes -, Mário Soares abordou a possível inadequação da sua candidatura presidencial. Ter admitido o facto tem, por si só, mais pertinência do que desistir. A realidade poucas vezes terá sido tão clara, goste-se ou não (por mim, não votarei em nenhum dos candidatos): uma parte significativa do eleitorado de Sócrates vai votar Cavaco e Sócrates continuará a viver do inelutável apoio desse eleitorado. Está, pois, traçado o quadro que irá reger a vida política nos próximos três anos. A margem de manobra para uma luta política de jeito só se voltará a colocar já para 2008.
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Ao contrário do que José Pacheco Pereira hoje afirma, creio que o "enfado" real que estas eleições carregam e o rico quadro de ilações que suscitam e provocam são coisas que correspondem a níveis e naturezas completamente diversos (são factos que nada têm a ver com perspectivas de vitória ou derrota). A primeira decorre da contenda entre um 'não-dito' meio sacrificial que se arrasta há meses e, por outro lado, um conjunto cansativo de práticas de esvaziamento retórico. A segunda está toda ainda em aberto e faz parte do horizonte com que pode já pensar-se a configuração de um novo ciclo político (na parte de cima do post, prefiguro uma coabitação ao centro com atritos muito dissuadidos no curto prazo, já que a base política legitimadora de Sócrates e Cavaco é bastante comum. A prazo, o centro acabará por se tornar sensível ao inevitável tumultuar do termo da legislatura e aí as posturas de Cavaco e Sócrates tenderão a pulverizar novos realinhamentos, hoje apenas latentes).