terça-feira, 29 de março de 2005

UM AMOR CATALÃO
Folhetim à moda clássica
VIGÉSIMO QUINTO EPISÓDIO
(O violinista afogueado)


Depois, o jovem violonista e Albe caminharam demoradamente através do Campo dei Frarí e da Calle Lipoli. E, subitamente, Albe sentiu que podia abrir-se e revelar tudo o que havia acontecido. Como se o destino quisesse provar que a felicidade, às vezes, não passa de um mero acaso com morada certa.
Não sabe o narrador explicar o modo como este desafio se tornou em autenticidade plena. Mas a verdade é que Albe não temeu abrir-se e o jovem estudante de violino, por seu lado, silenciou as suas palavras, ouvindo-as, repondo-as no ritmo próprio, ecoando-as com uma graça inexplicável.
Foi a noite mais imponderável que Albe alguma vez sonhou viver em toda a sua vida.

*

Passaram mais dois dias e duas noites e Albe nem sabe por que razão se terá aventurado daquela maneira. Quando tudo se perde, é o desmoronado brilho da paixão que parece querer incendiar os actos mais inauditos, os rumores mais elementare e simples.
Ficará o pasmo, o reencontro de uma dor antiga que se perpetua na fixidez do olhar, um aceno desiludido, desenganado, mas sobretudo mordaz.
E assim foi: de um momento para o outro, uma serenidade imensa abraçou os gestos de Albe e fê-la enfrentar o arrepio daquelas duas noites sem futuro, sem nada.
Ficou o desmedido calor da carne. A despedida. A dupla despedida.
Para sempre.
Amanhã, Albe voltará a sentar-se em S. Marcos. Já estou a vê-la, de novo a sós, a inventar que nada, abolutamente nada, se passou. No Verão e neste afogueado início de Outono.

(No próximo episódio, ficar-se-á a saber como é que Albe acabou por abandonar Veneza)

Continua