quarta-feira, 11 de agosto de 2004

Ficcionalidades de prata - 6


(Madame Schuller, Hugo Erfurth,1930)

Há sempre mistério, quando se pensa que estamos diante de um mistério. E diga-se a este propósito que o olhar é de tudo o que existe aquilo que melhor traduz a religiosidade, na medida em que ela é sempre a possibilidade de uma voz dizer outras vozes. No olhar, tudo se subsume e nada se figura. No olhar, tudo se desloca e nada se corporifica. No olhar, tudo se alvoroça e nada se aquieta. O olhar é a própia luz, ela mesma sob a forma de uma mensagem de nome diferido. O olhar é o próprio diferimento. Nele, no olhar, há uma voz que diz outra e outra que diz sempre outra. É o puro mise en abîme. Não sei o que olha essa mulher, nem para onde olha. Apenas sei que olha. Grande mistério, grande amor, grande redenção. Chamava-se Madame Schuller e eu olho-a agora sem conseguir deter o olhar que a olha. É isso a alma?