sexta-feira, 21 de maio de 2004

Entre bicharada



Um dia no cromeleque dos Almendres. Chego e vejo um autocarro estacionado, não no parque (muito mal tratado, diga-se), mas quase em cima dos menires. Motor ligado e fumarada a soprar sobre as vetustas pedras cheias de báculos, geometrias oclusas e círculos misteriosos. No meio do cromeleque, a rapaziada (era excursão de estudo de escola secundária) põe-se em cima dos menires e fotografava-se uns aos outros no meio de algazarra sadia. Estavam ali como se se passeassem pelas areias da República Dominicana, destino certo e decisivo que os espera no final da universidade. No meio disto tudo, depois de ter pedido com mil cuidados ao condutor para desligar o motor, perguntei em surdina a quem me acompanhava: onde andará a professora? Ao fim de uns minutos, apareceu a moçoila, sim, a professora, e lá continuou, animada e ululante, a avivar a festa e a responder a perguntas do género: onde é que mijamos, professora? A dita sorria e avisava com tom persuasivo e didáctico: paramos ali em Guadalupe (uma aldeia próxima), sempre é melhor, não acham? Democracia em pleno, assentimento geral, gáudio de um dia feliz. Minutos depois, quando o autocarro levanta um pó dos diabos e desaparece, lá voltei a encarar algum silêncio (cada vez mais, uma sorte e um sortilégio). Imagine-se, agora, que eu me armava em Português Positivo e tentava pôr alguma ordem na nave! Havia de ser bonita a resposta (pedagógica, claro). Imagine-se só. Há dias em que estamos entregues aos bichos, não é?