terça-feira, 10 de fevereiro de 2004

Pouca paciência assumida



Há um programa do novo canal dois a que fujo a sete pés. Chama-se Parlamento. O que se encena numa discussão deste tipo entre deputados é um exercício de paupérrima simulação (Ora simula lá tu, enquanto eu espreito para a cor garrida da gravata). Diz-se o óbvio, o correcto, ou ainda o que é susceptível de enquadrar o mais puro bom senso. Não se diz o nome da fissura, o encandeamento das diferenças, ou o ruído impiedoso das tácticas. Diz-se o sorriso, diz-se a face afável, diz-se a concordância em género e número. Não se diz o tremor, não se diz o inevitável, não se diz a impaciência. E quando é preciso pôr em cima da mesa algumas fracturas (para que o fantasma da democracia se confunda com a própria encenação), então recorre-se a um naipe verosímil de contrastes (geralmente entre partidos) que cabe num quadro de expectativas já conhecido e testado. Passa-se deste modo a um contraditório totalmente adquirido e digerido e fica tudo contente no fim a comer farinheira e a sugar um valente molho de brócolos. É por isso que as audiências preferem bons comentadores.