quarta-feira, 11 de fevereiro de 2004

Planear um mundo onde tudo bate certinho


Vermittlung von Kunstwerken, Ernst Barlach

Em certos meios, está na moda afirmar num tom algo futebolístico que a vida política se circunscreve e reduz a esquerda e direita. É um acordo codificado com sangue na guelra retórica que atravessa algumas franjas jovens de um lado e doutro do ringue político-cronista-bloguítico lusitano. Muito do discurso emanado por esta moda pós-pós-pós visa basicamente corresponder a este mesmo catalogar sumário, ou a esta súmula de expectativas estriadas dos que só assim estariam dispostos a perceber o mundo à sua volta. Como em todas as modas.
Se a abordagem, por mero acaso, não se molda a essa apressada e revivalista divisão esquemática - e a ultrapassa com toda a normalidade - muitos espíritos ficam tão decepcionados e espantados como os puritanos quando trocam o jargão pela metáfora. Muitos deixariam de blogar, ou de cronicar, no dia em que entrevissem o pequeno jogo em que estão metidos e que ajudam a criar no dia a dia. Mal vão as esquerdas, se só se imaginam esquerdas em debate de meio campo com estas direitas; mal vão as direitas, se só se imaginam direitas em debate de meio campo com estas esquerdas. Esquemáticas, simétricas e homólogas no sistema centrípeto que ambas, esquerdas e direitas, nutrem. E onde afinal se equiparam, sem quaisquer diferenças de fundo. É assim o paradoxal universo pós-pós-pós onde tudo bate certo, certinho. Modas revivalistas, é o que é.