Tácticas de flâneur - 2
Já em Lisboa. Após um longo passeio pelo Campo Grande, tive uma ideia. Não aquela ideia sagaz e genial, mas uma ideia. Uma imagem peregrina e ainda informe. Mas uma ideia, de qualquer modo. Revi um personagem obsessivo, escravo da tenacidade dos loucos, amigo de imagens fortes e silenciosamente comprometido com taras e desvarios que sé ele conhecerá na sua solidão irredutível e intransmissível. Imagino-o gordo, esbarrigado, com muita tosse, vermelho nas maçãs do rosto, voz fina, patilhas compridas, testa lisa, lábios grossos e sempre a fazer barulho quando mastiga uma omolete de queijo a transbordar de gordura. Estão a ver? Que fazer com ele? Eu já sei, mas não vou agora revelar. A blogosfera anda demasiado permeável ao terrorismo (nem vou - agora e aqui - exemplificar ou explicar porquê).
Um dia muito azul, Lisboa exuberante e os pássaros já a recolherem às árvores do Conde Barão. Passo, ausculto, olho e volto a entrar no Museu das Comunicações. Escrevo de rajada, entro e já saio. A vida é este deslize, este planar de flâneur, esta voragem a vogar numa voz, este ritmo orgânico e aberto a tender para o azul do céu e parta a cristalina aura que persegue a terra. Que é a nossa.