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(crónica publicada desde anteontem no Expresso Online)
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O Triunfo do Design - III
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Quando olhamos à nossa volta, não é raro sentirmos nos objectos, nas mensagens e no design que lhes dá corpo uma espécie de pulsação. É como se o nosso corpo andasse por aí, fora de nós, perdido entre as imagens que calcorreiam o planeta a uma velocidade estonteante. O facto tornou-se tão comum que uma simples referência, como é o caso, acaba quase sempre por misturar um fio de surpresa com a mais elementar constatação do óbvio. Esta aparente invisibilidade do design é um dos aspectos mais fascinantes do seu triunfo no nosso dia a dia.
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Nos últimos trinta anos muita coisa aconteceu para que tivéssemos chegado a esta troca de pulsações entre os objectos que nos vestem, transportam ou acomodam e nós próprios. Dou dois exemplos. O primeiro, já um clássico, deu pelo nome de “Lateral Thinking” (E. de Bono, 1970) e baseou-se na oposição entre a arrumação “vertical” da mente (sistema de “construção de padrões”) e as mensagens cujos formatos a conseguissem pôr em causa. As imagens “Benetton” dos anos noventa — hoje vulgarizadíssimas — constituíram um bom exemplo deste tipo de desmontagem, na medida em que obrigavam a suspender a padronização habitual da mente.
Nos últimos trinta anos muita coisa aconteceu para que tivéssemos chegado a esta troca de pulsações entre os objectos que nos vestem, transportam ou acomodam e nós próprios. Dou dois exemplos. O primeiro, já um clássico, deu pelo nome de “Lateral Thinking” (E. de Bono, 1970) e baseou-se na oposição entre a arrumação “vertical” da mente (sistema de “construção de padrões”) e as mensagens cujos formatos a conseguissem pôr em causa. As imagens “Benetton” dos anos noventa — hoje vulgarizadíssimas — constituíram um bom exemplo deste tipo de desmontagem, na medida em que obrigavam a suspender a padronização habitual da mente.
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O segundo exemplo tem apenas dois anos e apareceu por via das ideias de Lindstrom (“Brand Sense”, 2005) que estão agora a invadir o mercado sob o signo dos designs sensoriais: “saborear”, “cheirar”, “tactear”, para além dos mais clássicos “ouvir” e “ver” (Damásio acrescentar-lhes-ia certamente a variante “somatossensorial”). Estas duas formas visuais de atenção realçam, de modos diversos, a característica mais emblemática do design actual: fazer do presente um território realizável e crível que incorpore as nossas emoções e não um “mero trânsito”, como pretendiam os místicos medievais ou os ideólogos oitocentistas.
O segundo exemplo tem apenas dois anos e apareceu por via das ideias de Lindstrom (“Brand Sense”, 2005) que estão agora a invadir o mercado sob o signo dos designs sensoriais: “saborear”, “cheirar”, “tactear”, para além dos mais clássicos “ouvir” e “ver” (Damásio acrescentar-lhes-ia certamente a variante “somatossensorial”). Estas duas formas visuais de atenção realçam, de modos diversos, a característica mais emblemática do design actual: fazer do presente um território realizável e crível que incorpore as nossas emoções e não um “mero trânsito”, como pretendiam os místicos medievais ou os ideólogos oitocentistas.
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Os designs contemporâneos estão, pois, a estimular a migração dos nossos processos mentais e sensoriais, transformando o espaço público num complexo orgânico onde a nossa carne, as nossas pulsões e impulsos se revêem como se agissem no seu espaço mais íntimo.
Os designs contemporâneos estão, pois, a estimular a migração dos nossos processos mentais e sensoriais, transformando o espaço público num complexo orgânico onde a nossa carne, as nossas pulsões e impulsos se revêem como se agissem no seu espaço mais íntimo.
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Abruptamente, saltámos todos para cima do palco da tragédia grega. A grande catarse já lá vai e agora habituámo-nos a ser heróis ou vilões, tanto faz, que se entregam a um único desígnio: o desejo. É como se o riso, o choro, a livre associação de ideias, os pequenos prazeres ou a comoção que é própria dos grandes acontecimentos se libertassem das suas âncoras mais habituais para vaguearem, entre nós e nós próprios, de modo espontâneo. Este novo complexo orgânico — mais do que Big Brother, um verdadeiro Big Body especular e espectacular —, estando fora de nós, está também dentro de nós e sorri-nos diariamente nas ruas, nos outdoors, nos objectos domésticos, na televisão, na arte pública, na moda, nos blogues, nos desportos, na comunicação política ou nos hipermercados.
Abruptamente, saltámos todos para cima do palco da tragédia grega. A grande catarse já lá vai e agora habituámo-nos a ser heróis ou vilões, tanto faz, que se entregam a um único desígnio: o desejo. É como se o riso, o choro, a livre associação de ideias, os pequenos prazeres ou a comoção que é própria dos grandes acontecimentos se libertassem das suas âncoras mais habituais para vaguearem, entre nós e nós próprios, de modo espontâneo. Este novo complexo orgânico — mais do que Big Brother, um verdadeiro Big Body especular e espectacular —, estando fora de nós, está também dentro de nós e sorri-nos diariamente nas ruas, nos outdoors, nos objectos domésticos, na televisão, na arte pública, na moda, nos blogues, nos desportos, na comunicação política ou nos hipermercados.
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Através do sortilégio do design, a cidade global é cada vez mais preenchida pelo espelho confortado do nosso corpo e por uma nova confidência que se está a reencontrar consigo mesma. A satisfação, o usufruto e a paixão estão a fixar-se na cultura material que nos envolve como um segundo ar, tão sintético quanto espiritual.
Através do sortilégio do design, a cidade global é cada vez mais preenchida pelo espelho confortado do nosso corpo e por uma nova confidência que se está a reencontrar consigo mesma. A satisfação, o usufruto e a paixão estão a fixar-se na cultura material que nos envolve como um segundo ar, tão sintético quanto espiritual.
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Há uma nova ergonomia que nos está, a pouco e pouco, a levar o corpo (e as pulsações) para fora de si. Há uma nova encarnação que está a dar-nos de volta, no quotidiano mais insuspeito, o corpo, a alma e o pathos. Há um novo e deus em cena a escrever direito por linhas muito subtis.
Há uma nova ergonomia que nos está, a pouco e pouco, a levar o corpo (e as pulsações) para fora de si. Há uma nova encarnação que está a dar-nos de volta, no quotidiano mais insuspeito, o corpo, a alma e o pathos. Há um novo e deus em cena a escrever direito por linhas muito subtis.