sexta-feira, 12 de maio de 2006

Tonalidades & casos - 8

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a) “Na RTP anuncia-se que o filme “Dormindo com o inimigo” (sobre violência doméstica) é patrocinado pela Martini.”
b) “O fim de semana político assinalou a rendição da direita política perante o governo de José Sócrates.Os tratados de Maio de 2006, assinados unilateralmente por Marques Mendes , Ribeiro e Castro, e João Almeida fazem prever a rendição até ao Orçamento de Estado para 2008.”
e
Escrevem no mesmo blogue (Joana Amaral Dias, “a”; e Medeiros Ferreira, “b”). A primeira lança mão à subtileza pícara, à agenda em curso, à mitologia “fracturante”, à sátira valorativa e à denúncia menos velada. O texto acena, apenas mostra o que é necessário, depois escapa-se-nos e parte, como se irradiasse um brilho ou um sobressalto fugaz. Ninguém sabe onde se “anuncia” a RTP, em que meio, com que figura, a que horas, sob que formato. Fica apenas o impessoal como convém: “anuncia-se”. Depois há ainda os subtextos, a terrível entrega ao “inimigo” que transpirará nos lençóis do “sexus/plexus/nexus”. Fica o “Martini”, esse imbondeiro lascivo da cultura ocidental (que certos meios adoram converter em peircing de auto-mutilação). E ficará ainda a pairar a alegação e a sugestão. O segundo traz para a blogosfera o texto de corpo inteiro. Tudo está no seu lugar e reconhecem-se-lhe cabeça, tronco e membros. Na primeira frase, sabe-se que tudo terá ficado “assinalado” para, logo na segunda, se consumar a própria “rendição” antes prenunciada. A ironia quase não tem espaço – passe a polissemia atribuída a “rendição” -, na medida em que o jogo se denuncia de par a par no horizonte que o texto abre e logo fecha. É um texto sem errância, sem o prodígio da eventualidade. Coisa consumada e lacrada. Jornalística. Há, por vezes, tons que se desafiam num mesmo blogue, ou talvez insígnias que se apropriam, ou não, do meio onde escrevem.