segunda-feira, 24 de novembro de 2003

Soldadinhos de chumbo

O colunista Alcino Leite Neto escreve hoje no Folha de São Paulo:

A ampliação da capacidade militar da América do Sul e a formação pelos países deste continente de Forças Armadas comuns foi sugerida há poucos dias pelo ministro José Dirceu em palestra a empresários brasileiros e latino-americanos. Ele pensava sobretudo na utilidade dessas forças para proteção da área amazônica, que na sua opinião tem chances de ser ocupada militarmente pelos Estados Unidos. A previsão parece remeter a filmes de ficção científica, mas partiu de um homem de Estado que não costuma gastar à tôa as suas palavras.

A única novidade do raciocínio de Dirceu é pensar a proteção da região amazônica como uma cooperação entre países latino-americanos contra o grande irmão maldoso do Norte. Outrora, nos tempos militares, vigoravam princípios menos cooperativos com os vizinhos (exceto, claro, no combate à subversão), e os EUA eram um aliado respeitoso diante da praga comunista propagada pela URSS.A pesar de ter afirmado que a idéia de uma nova era de investimentos militares na América Latina era unicamente sua, e não do governo, é muito difícil crer que Dirceu não tenha soprado a sugestão nos salões privados do Planalto. E é provável que ela seja compartilhada pela cúpula do poder petista, com seu bolivarismo recalcado.


A citação é grande, mas é de leitura útil. Sobretudo porque dá a entender o que é o delírio geo-estratégico e o alheamento radical face a um mundo que está a ser dominado por uma globalização anti-democrática e de tendência hiperterrorista. Apesar dos erros do Ocidente e dos EUA na crise iraquiana, é de facto preciso delirar para trocar completamente os alvos como se a realidade fosse feita de soldadinhos de chumbo a lutarem no sótão de um qualquer ministério.