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terça-feira, 31 de outubro de 2006

Quando blogar é ficção apetecida - 1


José M. Rodrigues
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NOVA RUBRICA: Durante os meses em que desenvolvi o projecto de um blogue em Inglês (o “Minion” – primeiro semestre de 2005), criei uma rubrica que designei por “The blank blog is staring back at you” e que se iniciava sempre assim: “Bloggers sometimes become characters much like blogging becomes a literary mode”. A intenção era publicar extractos de posts que encarnassem uma (às vezes involuntária) dimensão ficcional. De tal modo que era como se estivessem mesmo a pedir que lhes escrevêssemos os inícios e finais dos enredos, ou tão-só que os deixássemos ao sol em estado de perpétua e apetecível media res. Existe muito desse material a pairar no gravitas da blogosfera. É outro suplemento da riqueza deste novo mundo, raramente desnudado ou tão-só convertido em tema de diálogo. A minha intenção nesta nova rubrica é passar a expor, de tempos a tempos, esses extractos de posts e dar-lhes assim a vida e o alento que a ostensão acaba sempre por suscitar.
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O primeiro post da nova rubrica é de Rui Bebiano:
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"Seguia num velho autocarro que, em final de tarde, atravessava a Mancha rumo a Barcelona. O machimbombo tinha uma espécie de animação cultural: um motorista entradote mas bastante jovial, que intercalava horríveis cassetes contendo extractos de zarzuelas, interpretadas pela Orquestra y Coros da Radio Nacional de España, com obtusas anedotas «de andaluzes». Em alguns casos, estas pareciam-me até ser a cópia, se não o original, das nossas obtusas anedotas «de alentejanos». De tempos a tempos, conseguia abstrair-me do ruído de fundo e olhar a paisagem que era para mim aquela que havia associado à figura do Quixote."
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Rui Bebiano/A Terceira Noite (5/10/06)

Mini-entrevistas - 46

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O Miniscente tem estado a publicar desde o fim de Agosto uma série de entrevistas acerca da blogosfera e dos seus impactos na vida específica dos próprios entrevistados. Hoje o convidado é Jorge Mangas Peña, redactor do Centro Virtual Cervantes - Instituto Cervantes, 36 anos, Madrid.
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- O que é que lhe diz a palavra “blogosfera”?
La palabra «blogosfera» me dice que el mundo se abre a la opinión de personas que con anterioridad no podían difundir sus puntos de vista, sus sentires sobre multitud de acontecimientos globales o locales, sus pensamientos íntimos o prosaicos, sus preferencias culturales o sus simples rutinas diarias. Lo que antes a menudo quedaba reducido al diario personal (o, con suerte, si se era un escritor o un artista reconocido, al libro o a una tribuna de prensa), ahora queda accesible a través de la red de Internet a quien la navegue y se deje seducir, a conciencia o sin haberlo sospechado, por esos sentires, puntos de vista, pensamientos...
- Seguiu algum acontecimento nacional ou internacional através de blogues?
Sí, sigo algunos acontecimientos diversos a través de blog, aunque no propiamente de blog particulares, sino de los que algunos periódicos en sus ediciones electrónicas han encargado a algunos articulistas (sobre todo en lo que se refiere a la cultura en general, el cine, la crítica televisiva) o a los lectores del periódico (acontecimientos locales de mi ciudad, Madrid, por ejemplo).
- Qual foi o maior impacto que os blogues tiveram na sua vida pessoal?
No sigo los blog desde hace demasiado tiempo, pero poco a poco se han abierto camino en mi vida diaria. Casi todos los días dedico unos minutos a consultar alguno de los que he mencionado en la respuesta número 2. Si no leo alguno de los blog, ciertamente he llegado a sentir que ese día «me falta algo importante» y lo echo en falta.
- Acredita que a blogosfera é uma forma de expressão editorialmente livre?
Sí, creo que lo que se escribe en un blog posee más libertad que otro tipo de escritos de opinión o crítica. Veo el blog como una manera de tomarle el pulso al avance de cada día, un pulso más directo y natural que el que se puede tomar a través de una noticia reseñada en un periódico, en la radio o la televisión, noticias tamizadas en estos últimos casos no sólo por el hacer del periodista, sino también por la línea editorial del medio en el que publica.
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Nos posts de baixo: entrevistas a Carlos Zorrinho, Jorge Reis-Sá, Nuno Magalhães, José Luís Peixoto, Carlos Pinto Coelho, José Quintela, Reginaldo de Almeida, Filipa Abecassis, Pedro Baganha, Hans van Wetering, Milton Ribeiro, José Alexandre Ramos, Paulo Tunhas, António Nunes Pereira, Fernando Negrão, Emanuel Vitorino, António M. Ferro, Francisco Curate, Ivone Ferreira, Luís Graça, Manuel Pedro Ferreira, Maria Augusta Babo, Luís Carloto Marques, Eduardo Côrte-real, Lúcia Encarnação, Paulo José Miranda, João Nasi Pereira, Susana Silva Leite, Isabel Rodrigues, Carlos Vilarinho, Cris Passinato, Fernanda Barrocas, Helena Roque, Maria Gabriela Rocha, Onésimo Almeida, Patrícia Gomes da Silva, José Carlos Abrantes, Paulo Pandjiarjian, Marcelo Bonvicino, Maria João Baltazar, Jorge Palinhos, Susana Santos, Miguel Martins e Manuel Pinto.

segunda-feira, 30 de outubro de 2006

Micro-causa: Voz Off

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Uma micro-causa iniciada pelo Miniscente à qual A Sombra se juntou de muito bom grado. Agradece-se o envio do seguinte texto para a RDP Antena 2, através dos contactos que podem ser encontrados no respectivo website:
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Embora seja do conhecimento público que a actual programação da Antena 2 "reflecte uma atitude de abertura a novas ideias, em busca de novos ouvintes e novos hábitos sem comprometer a fidelidade do actual auditório", vimos apelar, na qualidade de ouvintes regulares da estação, para que a habitual continuidade musical não seja ofuscada pela exagerada presença da voz que se tem vindo a sentir ultimamente.

bizarrias

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Ontem à noite li, estranhei, mas acabei por ir para a cama tranquilo. Hoje, voltei a confirmar e reparei que é mesmo verdade: o blogue anónimo que denunciava aquilo que traduzia através da palavra "plágio" - e de que já disse tudo o que tinha a dizer - aparece hoje embebido pelos maiores encómios a Miguel Sousa Tavares. Esta operação - bélica ou paródica, própria ou alheia? - deixa a um canto o falso Abrupto do Verão passado e leva-nos a pensar e a questionar a todos nós, bloggers: e se um dia, de manhã, estes mesmos senhores nos fizerem o que agora fizeram, com desmedida ligeireza e eficácia, ao "Freedom to Copy" (clique aqui e repare como é bizarro o novo link do blogue anónimo subitamente ocupado)?
Estas coisas dão que pensar com todas as letras e cores.
Devo acrescentar que não me interessam nada as denúncias de plágio, nem tão-pouco o traçado preciso ou incerto do Equador. Interessa-me, sim, a liberdade.

Retrovisor - 10


AFA
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Extractos de posts que dão conta do olhar (prevenido ou desprevenido) do blogger sempre que contempla pelo retrovisor a paisagem da blogosfera
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"Uma leitora que assina Jurubinda da Concavada manifestou por correio electrónico a sua indignação: «Lendo-o, parece que quer acabar com o Ministério da Cultura.» Prezada Jurubinda, se me tivesse lido com atenção nos 21 meses que levo de bloga teria percebido quanto o ministério da Cultura me parece uma excrescência."
Eduardo Pitta (16/10/06)
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Ficha Técnica
Qualidade da vista: exótica, recheada com papagaios oriundos de vales longínquos.
Estado da viajante: resoluto, dominando com precisão os instrumentos de bordo.
Tipo de espelho: lisíssimo e cintilante.
Tom (linguagem vs. rede): Entre Moderato e Allegro.
Outras impressões: Se os asteróides e poeiras da nova atmosfera de bites são de proveniência variada, não é de admirar que nem a mais recente ontologia tenha conseguido assinalar seres como a Jurubinda. Fazem parte de uma espécie muito em voga na Concavada, um território cheio de vales e deltas que faz lembrar Delfos embora sem a invernia e os nevões. Na ecologia da Concavada, o horizonte nunca se altera. O sol não muda de posição e tudo o que historicamente foi adquirido não está sujeito a metamorfoses. É uma espécie de interface a que os semióticos ligados às morfodinânicas e à morfogénese, Petitot e Brandt entre outros, têm dedicado estudos de razoável efeito e profundidade. Na célere navegação blogosférica, eis que um desses meteoros se aproximou da nave de Eduardo Pitta. A resposta do viajante foi imediata e não deixou as excrescências por mãos alheias. Depois do brevíssimo impacto, a vista ficou de novo límpida. E ao longe, entre uma luz violeta e vaga, a cultura vagueava pelo espaço como se fosse uma das visões danielíticas de Deus. Coitada.

domingo, 29 de outubro de 2006

Micro-micro-micro-causa

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Como ouvinte regular da Antena 2, venho convidar o país e as diásporas a persuadirem a RDP para que reponha a continuidade musical e silencie o desmesurado blá blá blá que, a pouco e pouco, está a dominar a estação.

sábado, 28 de outubro de 2006

Retrovisor - 9

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Extractos de posts que dão conta do olhar (prevenido ou desprevenido) do blogger sempre que contempla pelo retrovisor a paisagem da blogosfera
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Ninguém me perguntou nada, mas isto é um blogue. E um blogue, caramba!, serve para postarmos opiniões banais sobre coisas insignificantes ou então é ao contrário, que é outra forma de dizer o mesmo.”
Carlos Cunha (3/10/06)
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Ficha Técnica
Qualidade da vista: Desimpedida, montanhosa, propagadora de ecos.
Estado da viajante: Avidez comunicativa.
Tipo de espelho: Côncavo, reflexão com alguma anamorfose.
Tom (linguagem vs. rede): De Vivace a Presto.
Outras impressões: Como se fosse um carro desportivo na estrada que cruza o deserto de lés a lés (a imagem faz lembrar a abertura de Un Chien Andalou: a nuvem e o olho penetrados em contracampo pela nuvem e pela lâmina). Como se o viajante fosse levado a parar e gritasse na direcção da massa rochosa que detém a súbita imploração. Como se a necessidade de dizer e de explicar suplantassem a viagem, a navegação, o surf ou tão-só a condução. Geralmente, a blogosfera funciona ao contrário: é a permanente rotação dos dados – a actualização infinda do blogue – que se sobrepõe ao cuidado extremoso do que se diz, frase a frase. É a toda poderosa circulação de bites que se impõe – tal como a vista do deserto se impõe ao viajante – ao nexo da locução, palavra a palavra. Mas neste caso, Carlos Cunha debate-se com a vista, confronta-a e disputa sobretudo o sublime imobilizado que a constrói. O blogue suspende a sua lógica, escuta a prece do blogger que o enuncia (essas “coisas insignificantes”, esses detalhes onde os deuses se revelam) e continuará depois na sua perpétua viagem. Post a post.

sexta-feira, 27 de outubro de 2006

Rascunhos de fds

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As pálpebras estão pesadas e o corpo é uma mancha incerta que mal se sabe acordada: do passado vem um vento que galopa, um calafrio antigo, os cabelos no ar em frenesi como se lavassem o ouro do fundo da terra.
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E a pele lavrada pelo vazio a que as mãos se entregam no cativeiro: são delírios que fustigam, pequenas tempestades que chegam com o som dos gansos ao longe; filamentos de nuvens perdidas que são ameaça sob a forma de minúcia. Há um leito por onde passa a respiração, às vezes a tosse, ou mesmo o som das cordas vocais apenas para testar se ainda cintilam.
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E quando o sono surge nada se pasma: é uma morte macia, humedecida. Há muito que esqueceu a represa de águas onde descobriu o sorriso, hoje um vagar esfomeado e sem fulgor. Uma cartilagem falecida onde pousam flores invisíveis. Do passado vem um vento que galopa, um breve tremor. Nada mais.
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(micro-extracto do meu próximo e décimo romance, coisa ainda sem nome)

Retrovisor - 8


AFA
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Extractos de posts que dão conta do olhar (prevenido ou desprevenido) do blogger sempre que contempla pelo retrovisor a paisagem da blogosfera
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"É a primeira incursão de Inácio Steinhardt pela blogosfera. Chama-se História das Palavras e promete desenlear os novelos de história e histórias que se escondem por detrás de palavras comuns da língua portuguesa. Começou há menos de uma semana, mas já tem muito que ler atentamente."
Nuno Guerreiro (21/09/06)
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Ficha Técnica
Qualidade da vista: Claríssima, mas a desvendar a pouco e pouco.
Estado do viajante: Prevenido e amante de anunciações.
Tipo de espelho: Convexo e obviamente generoso.
Tom (linguagem vs. rede): Várias gradações entre Adante e Allegro.
Outras impressões: O Rua da Judiaria é um blogue que faz da vista para outros blogues uma das suas qualidades. Não estou a falar de networking com fins determinados, mas do jogo de espelhos habitual com que o Nuno reflecte este novo e imparável movimento de translação que é a blogosfera. Nem sempre a vista que o blogger tem da blogosfera é positiva e generosa; muitas vezes é claramente ressentida e amarga. O blogue do Nuno pertence ao primeiro tipo e, por isso, nos acena regularmente as suas novidades com total despojamento. Desta feita, a lente aponta para um blogue de Inácio Steinhardt que se propõe abordar o labirinto de histórias que polvilha o universo das palavras. O olhar passará a fixar-se cirurgicamente no novo alvo e de lá não sairá até que a indagação se sacie. Ver pelo retrovisor significa ver bem e depressa, razão pela qual também o Inácio passará a ter – oxalá assim seja - muitas visitas, embora intermitentes. Até porque, ao contrário da história original das palavras, é essa mesma a natureza do olhar do blogger.

quinta-feira, 26 de outubro de 2006

Retrovisor - 7

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Extractos de posts que dão conta do olhar (prevenido ou desprevenido) do blogger sempre que contempla pelo retrovisor a paisagem da blogosfera
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"Verosimilhança de quietude, com o fluir lentíssimo deste tempo de outono. O post anterior foi escrito antes da chuva, que despertou em mim afãs de bicho diligente e zelador da sua toca e por aqui andei corre que corre, a fechar janelas, a ver bem se estão fechadas como deve ser, se está tudo bem. Enquanto ia de uma para outra, pensava onde pus os livros. Não todos, mas os que leio por estas alturas e que direi depois."
Impensado AT/Impensável (16/10/06)
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Ficha Técnica
Qualidade da vista: Razoável visibilidade, alguma água ainda no horizonte.
Estado da viajante: Prevenido e cuidadoso.
Tipo de espelho: Côncavo, reflexão com alguma anamorfose.
Tom (linguagem vs. rede): Entre Adantino e Moderato.
Outras impressões: uma vista que faz lembrar a que Garrett vislumbrou da sua casa de Santarém em tempo de cheia (quando ainda havia cheias regulares, coisa de que me lembro por sinal). Era um arrasador espelho de silêncio, mas sem qualquer conformidade com a “verosimilhança”. Tinha respiração própria e parecia abraçar o universo de lés a lés. Dava-se a ver como um espaço recurvado sob o céu que nele se embebia: um gigantesco post que mobilizaria para o blogue do autor de Camões e Dona Branca a mais intrigante das diligências. Foi por isso, talvez, que aquela literatura decidiu escapar às regras que até então formigavam nos salões e se expandiu ao ritmo incerto dos sentimentos (um vaivém sem fim para compor o desconcerto, para medir a pulsação da alma; para “ver” se estaria “tudo bem”). A vista pluvial do post do Impensável fez-me reentrar nesta homologia nostálgica de vistas que apela, afinal, à simplicidade: cuidar dos interiores, da casa como metáfora do espírito, do ir e vir como elementar palpitação dos sentidos.

Blogues e Meteoros - 8

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Hoje, no Expresso Online (Blogues e Meteoros):
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O exílio das mulheres portuguesas
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É verdade que, na antiga tragédia, Édipo matou o pai e casou com a mãe que tinha o lindo e promissor nome de Jocasta. O deleite, a presença e o mistério da primeira das mulheres alimentaram o destino singular de Édipo e acabariam, séculos mais tarde, por dar corpo ao mais célebre ditame da psicanálise.
O caso português é em tudo oposto ao que Freud enalteceu quando interpelou os desvarios do Édipo Rei de Sófocles, já que, logo no início da saga, D. Afonso Henriques transformou a possível atracção edipiana em destemida ira e conquista. O ‘Complexo de Henriques’ mais não é do que a conquista de um espaço de eleição a que os deleites, a presença e os mistérios da mulher são rigorosamente alheios.
Esta postura teve os seus continuadores de excelência, sobretudo através dos protagonistas dos chamados “mitos portugueses”. Pedro jamais partilhou à luz do dia a viva plenitude da sua Inês, a não ser, ressentido e vingado, no lúgubre beija mão de Alcobaça e depois no variadíssimo corpo de lendas que foi frutificando em peças de teatro e em óperas pelo mundo fora. Ao lado deste mito do “amor eterno”, como lhe chamou Natália Correia, o nosso mito messiânico despertou na desventura de Sebastião, esse rapaz tão aventureiro e misantropo quanto temente de uma bela e exaltada roda de sete saias. Mais tarde, os cultores do “império espiritual lusitano”, ou se dedicaram feericamente à panóplia profética e às grandes e arriscadas viagens, caso de Vieira, ou se iniciaram com timidez ao som da “chuva oblíqua” sempre recheada pelo pudor e pelo “ridículo” das cartas amorosas, caso de Pessoa. Já no século XX, o culto mariano – que fez contracampo cinematográfico ao “bolchevismo” de então – reatou a saga henriquina original, desta feita espiritualizando a mulher e convertendo-a numa divindade intocável, tal como já havia feito D. João IV quando doou a coroa dos reis de Portugal a Nossa Senhora da Conceição nos idos da Restauração.
Tudo bate certo, como se vê: de uma maneira ou de outra, o geniceu fica sempre de fora da narração: por pudor, por medo, por ira ou até por mística deslumbrada.
Eu que sou um céptico visceral face a tudo o que, na “Academia”, seja da ordem do “gender” ou da “filosofia portuguesa” (sempre que vejo uma universidade a investir nessas epistemologias, desconfio) não posso, no entanto, deixar de constatar como é que o primeiro – no caso do feminino – é, entre nós, historicamente prisioneiro da segunda.
Toda esta prosa encantada mas verdadeira tem uma finalidade, caro leitor. A crónica nunca é inocente nem desprevenida, para mais quando se ocupa de blogues.
Deixo por isso a pergunta final: para além das excepções da praxe, não será por causa de todo este pesado enredo histórico que são da autoria de mulheres os blogues portugueses em que mais se funde o humor, a paródia, a têmpera, o desconcerto, a provocação e a vitalidade? Querem confirmar? Ora passem, entre outras, pela
Zazie, pela Carla Quevedo, pela Rititi, pela Lolita, pela Fernanda Câncio, pela Cláudia Vicente, pela Isabel Goulão, ou pela Catarina e digam lá se não é assim mesmo!? (e tenho a certeza de que o material de prova fica ainda no adro, tal como ficou para sempre nos meus ouvidos a Procissão de Lopes Ribeiro e Villaret).
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P.S. - 1 - Ver mais "material de prova" no menu "KO" do Cibertertúlia.
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P.S. - 2 - Continua a "anomalia" no Expresso Online: clicando no destaque, editado na Home Page, o respectivo link não é accionado. Texto integral apenas aqui, portanto. Azar, o meu?
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P.S. - 3 - Achei curiosíssimo, ontem - num programa de humor designado pela RTP por "Grandes Portugueses" -, que a deputada do BE, Joana Amaral Dias, tenha dado o exemplo dos blogues para provar a (ainda) muito limitada "participação cívica" das mulheres na "nossa sociedade". Há pastorinhas que aprendem muito cedo a cuidar dos seus rebanhos imaginários.

quarta-feira, 25 de outubro de 2006

Retrovisor - 6


AFA
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Extractos de posts que dão conta do olhar (prevenido ou desprevenido) do blogger sempre que contempla pelo retrovisor a paisagem da blogosfera
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A escrita gasta-se? Suponho que sim. Tenho escrito tanto e sobre coisas tão diferentes que, no fim, não sobra nada que possa ser usado aqui.”
Manuel Jorge Marmelo/Tatarana (4/10/06)
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Ficha Técnica
Qualidade da vista: Clara com nuvens altas. Algum cansaço nos olhos.
Estado da viajante: Particularmente prevenido.
Tipo de espelho: Côncavo, centrado, mas não narcisista.
Tom (linguagem vs. rede): Mais lento do que Adagio (sem grande pathos).
Outras impressões: Ora aqui está um caso que me é familiar. Trata-se de uma vista soberba que é, ao mesmo tempo, uma paisagem sempre por preencher. Acontece quando o blogger atravessa constantemente outras escritas, outros espaços, outras vias. E quando regressa ao coração da sua nova atmosfera pouco já parece restar, a não ser a formulação de uma questão (ou de um augúrio imponderável): Que escrever? “Que usar aqui?” Que reservar ainda para este hemisfério, onde as palavras são faces não menos provisórias do que os próprios posts? Estamos, neste caso, nos antípodas da “branquíssima” sacralização de Mallarmé. Ou seja: ao contrário de um espaço religioso e sincopado por habitar, o esgotamento das escritas convoca muitas vezes a avidez, a compulsão e o constragimento criativos. Podendo gerar resultados únicos, já agora.

terça-feira, 24 de outubro de 2006

Mais um plágio, mais uma voragem!

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Em tempo de transtextualidades ácidas e convulsivas, o plágio tem outro sabor. Não certamente o oitocentista. Às vezes, aparece às claras e sem aparente necessidade (caso Clara Pinto Correia); outras vezes, é algo forçado e reflecte características endógenas (caso Margarida Rebelo Pinto); outras vezes ainda, parece limitar-se a admirar o incauto pelo modo e pelo timing com que se anuncia e até pela atenção bibliográfica do putativo plagiador (o caso de hoje, i.e., de Miguel Sousa Tavares).
Por outro lado, não posso deixar de o confessar, os detectives e pesquisadores de plágio sempre tiveram para mim o seu quê de perverso e nubloso. E quando subitamente aparecem na desejada ribalta a denunciar, vejo-me sempre a perguntar em silêncio tumular: o que teriam eles feito ao tempo com que se ocuparam de tais crimes hediondos, se tivessem antes activado o brilho do seu próprio génio criador? E fico invariavelmente sem resposta. And you?

Atenção mulheres blogueadoras!

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Só vos digo que ameaça ser uma bomba, que sai amanhã ao mesmo tempo no Expresso Online e aqui no Miniscente... e que termina assim:
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"Querem confirmar? Ora passem, entre outras, pela Zazie, pela Carla Quevedo, pela Rititi, pela Lolita, pela Fernanda Câncio, pela Cláudia Vicente , pela Isabel Goulão ou pela Catarina e digam lá se não é assim mesmo!? (e tenho a certeza de que o material de prova fica ainda no adro, tal como ficou para sempre nos meus ouvidos a Procissão de Lopes Ribeiro e Villaret)."

Retrovisor - 5


AFA

Extractos de posts que dão conta do olhar (prevenido ou desprevenido) do blogger sempre que contempla pelo retrovisor a paisagem da blogosfera
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Não posso deixar de ficar enternecida quando vejo que pesquisam no google "blog da miss pearls". É como bater à porta ou tocar à campainha. Tivesse o blog visor incorporado e falávamos pelo intercomunicador.”
Isabel Goulão (17/10/06)
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Ficha Técnica
Qualidade da vista: cristalina, imaginativa e deleitada.
Estado da viajante: Prevenida e admirada ao mesmo tempo.
Tipo de espelho: Convexo e generoso.
Tom (linguagem vs. rede): Entre Andante e Andantino.
Outras impressões: O blogue é uma nave especial ainda recente. O seu cosmos é todo ele uma surpresa. Entre asteróides e bites que gravitam sem grande direcção e aqueles que ameaçam colisão, há de tudo. A rede é um caleidoscópio esférico de muitas direcções. A ubiquidade é o seu lema maior. Quando um desses corpos vivos, qual mónada, vem na direcção do próprio blogger e anuncia a sua chegada com boa-fé e bonomia, é caso para uma reacção calorosa. O enternecimento é um efeito de gratidão e podia ser alimentado para sempre, se fôssemos já cyborgs. Eu sei que ainda vai levar algum tempo, mas podemos já encomendar as partes sensíveis do visor e alguns implantes que permitam à mente visionar imagens doutras galáxias. Nesse dia de grandes visões (tácteis, perceptivas, olfactivas, etc.), não só superaremos o Google como passaremos a estar em todo o lado ao mesmo tempo com todos aqueles que já amámos. Nesse dia, o blogger andará de mãos dadas com os anjos. E já nem será preciso retrovisor.

segunda-feira, 23 de outubro de 2006

A utilidade das datas

Budapeste, 23 de Outubro de 1956
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Trata-se apenas de lembrar que o nazismo, o fascismo e o comunismo são iguais quanto ao modo como tratam a liberdade. Mais nada.

Retrovisor - 4

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Extractos de posts que dão conta do olhar (prevenido ou desprevenido) do blogger sempre que contempla pelo retrovisor a paisagem da blogosfera
Rui Curado Silva (18/06/06)
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Ficha Técnica
Qualidade da vista: a preto e branco, límpida, romântica e voraz.
Estado do viajante: Quase desprevenido.
Tipo de espelho: Convexo e bastante generoso.
Tom (linguagem vs. rede): Allegro, Vivace e razoavelmente Presto no final.
Outras impressões: O Rui Curado da Silva evoca através do Nuno Mota Pinto a abertura de um dos filmes antológicos das nossas vidas. Aquela Nova Iorque é, ela mesma, uma antologia de variadíssimos sonhos intemporais: o cinema, a arquitectura, o voo, a liberdade, a perpétua vontade de regressar. E há ainda a avidez de George Gershwin. A vista do blogger resume-se cada vez menos às áleas verdejantes da blogosfera, coisa que também aconteceu aos médicos quando deixaram de ser “semeiólogos” do corpo para passarem a ser engenheiros que diagnosticam artefactos, isto é, resultados de análises e exames. O “YouTube” é um dos artefactos actuais da rede – está na moda! – que mais vai substituindo o horizonte real que deveria estar na frente do olhos do blogger. No entanto, entre a miríade de imagens que os bloggers utilizam hoje em dia em vez do nada que teriam para dizer, estas imagens valem por litros e litros de água natural e sagrada da fonte mais abençoada de Delfos.

Mini-entrevistas - 45

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O Miniscente continua a publicar uma série de entrevistas acerca da blogosfera e dos seus impactos na vida específica dos próprios entrevistados. Hoje o convidado é Manuel Pinto, director do CECS - Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade, da Universidade do Minho
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- O que é que lhe diz a palavra “blogosfera”?
Denuncia e ao mesmo tempo prenuncia um espaço ainda relativamente invisível que representa uma ampliação da esfera pública e da conversação social. O seu lado babélico esconde, apesar de tudo, zonas, recantos e iniciativas de enorme variedade e interesse. Esferas de preocupações, fóruns onde comparecem novos actores. Uma novidade (relativa) onde é possível encontrar de tudo, incluindo o que de mais velho e relho imaginar se possa.
- Seguiu algum acontecimento nacional ou internacional através de blogues?
Segui vários, quer nacionais quer internacionais. Recorto com nitidez o caminhar para a (e o acontecer da) guerra no Iraque. E como era, então, difícil manifestar dúvidas, suscitar interrogações, perante as certezas de quem não só acreditava não haver outro caminho como pretendia apertar os calos a quem disso duvidasse.
- Qual foi o maior impacto que os blogues tiveram na sua vida pessoal?
Descobri os blogues e a blogosfera em Fevereiro de 2002, através de uma aluna de mestrado que apareceu numa aula de Sociologia das Fontes Jornalísticas com um trabalho sobre o fenómeno. Da discussão então surgida nasceu o blogue Jornalismo e Comunicação (http://webjornal.blogspot.com/), que entretanto cresceu e conquistou o seu espaço. Desde cedo me dei conta de que através dos blogues ou de outras ferramentas e serviços, algo de novo adquiria foros de cidadania. Muito por causa da tecnologia, mas também muito por causa da nossa necessidade de redescobrir a participação, de conversar, de intervir. O primeiro encontro nacional de weblogs, que organizámos na Universidade do Minho em Setembro de 2003 (e que teve cobertura no Telejornal, com a criação de um blogue em directo) foi o desenvolvimento lógico dessa descoberta inicial.
- Acredita que a blogosfera é uma forma de expressão editorialmente livre?
Livre no sentido de todos poderem exercer tal liberdade entendo que não, dado que o fosso digital (não só tecnológico e económico, mas também – sobretudo? - cultural) ainda é importante.
Livre no sentido de podermos dizer o que queremos, creio que sim, salvaguardando que, tal como na vida, e como escrevia Ortega y Gasset, "eu sou eu e as minhas circunstâncias". Diria, assim, que a blogosfera é mais um espaço onde se constrói (ou não) a liberdade.
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Nos posts de baixo: entrevistas a Carlos Zorrinho, Jorge Reis-Sá, Nuno Magalhães, José Luís Peixoto, Carlos Pinto Coelho, José Quintela, Reginaldo de Almeida, Filipa Abecassis, Pedro Baganha, Hans van Wetering, Milton Ribeiro, José Alexandre Ramos, Paulo Tunhas, António Nunes Pereira, Fernando Negrão, Emanuel Vitorino, António M. Ferro, Francisco Curate, Ivone Ferreira, Luís Graça, Manuel Pedro Ferreira, Maria Augusta Babo, Luís Carloto Marques, Eduardo Côrte-real, Lúcia Encarnação, Paulo José Miranda, João Nasi Pereira, Susana Silva Leite, Isabel Rodrigues, Carlos Vilarinho, Cris Passinato, Fernanda Barrocas, Helena Roque, Maria Gabriela Rocha, Onésimo Almeida, Patrícia Gomes da Silva, José Carlos Abrantes, Paulo Pandjiarjian, Marcelo Bonvicino, Maria João Baltazar, Jorge Palinhos, Susana Santos e Miguel Martins.

sábado, 21 de outubro de 2006

Retrovisor - 3

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Extractos de posts que dão conta do olhar (prevenido ou desprevenido) do blogger sempre que contempla pelo retrovisor a paisagem da blogosfera
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"De vez em quando visito, nostálgico, o meu primeiro blogue. Tantos posts, tantas polémicas e diatribes, tantos entusiasmos e irritações, tantas horas agarrado ao computador noite dentro. Era eu, aquele blogger febril?"
José Mário Silva (15/09/06)
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Ficha Técnica
Qualidade da vista: Límpida.
Estado do viajante: Prevenido.
Tipo de espelho: Liso mas nada neutro.
Tom (linguagem vs. rede): Entre Allegro e Vivace.
Outras impressões: Deste post vê-se o lugar do crime. É um tipo de vista que gosta de ser sempre revista: disso apenas dá conta a própria vista e aquele que humildemente a observa. E as coisas nunca dão certas, já se sabe. Quanto mais o tempo passa, menos o quintal e a folhagem se enquadram. Sobra sempre aquilo que dava alicerce e consistência ao olhar original. O que era colossal vai-se agora redimensionando, enquanto a interrogação do voyeur humedece a pouco e pouco de exaltação. Muitas vezes esta exaltação assemelha-se à serenidade. E a resposta torna-se então afirmativa: - “Sim, eu era aquele “blogger febril”.

sexta-feira, 20 de outubro de 2006

Retrovisor - 2

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Extractos de posts que dão conta do olhar (prevenido ou desprevenido) do blogger sempre que contempla pelo retrovisor a paisagem da blogosfera
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"Para anunciar que este blog vai acabar, já seria demasiado tarde: há semanas que quem passa por aqui não encontra novidades. Para anunciar que acabou, seria cedo: ainda não sei o que me reservam os próximos meses. Não sei se é purgatório, se é apenas limbo este estado em que me encontro." Ivan / A Praia (18/10/06)
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Ficha Técnica
Qualidade da vista: Baça e levemente obstruída.
Estado do viajante: Prevenido.
Tipo de espelho: Côncavo, mas pouco narcisista.
Tom (linguagem vs. rede): Entre lento e Adagio.
Outras impressões: Deste extracto de post vêem-se tempos desencontrados, rebanhos a descer encostas outonais, terra preta e estépica, desolações pressentidas entre o fausto da nostalgia e uma flânerie que se perde em todas as direcções. O blogger contempla a vista pelo retrovisor, mais ou menos despreocupado, mas desconhece o caminho que o conduziria à falésia das miragens encantatórias. Segue em frente com o mesmo frémito que terá inspirado o protagonista de A Música do Acaso do Paul Auster. O estado em que se encontra é tão cristalino quanto óbvio: entre anunciações.

Mini-entrevistas - 44

e
O Miniscente continua a publicar uma série de entrevistas acerca da blogosfera e dos seus impactos na vida específica dos próprios entrevistados. Hoje o convidado é Miguel Martins, editor de multimédia do Expresso.
e
- O que é que lhe diz a palavra “blogosfera”?
Remete-me para o conceito subjacente à palavra "ciberespaço". Está lá, lê-se, ouve-se, vê-se, é de todos não sendo de ninguém. O mundo físico não lhe pode tocar, mas a sua influência na sociedade é maior do que alguma vez se conseguiu prever. Cada dia que passa são criados cerca de 180 mil blogues no mundo inteiro, um número que fala por si.
- Seguiu algum acontecimento nacional ou internacional através de blogues?
Internacionais apenas. Vários. O último foi o conflito Israel/Líbano. De resto, em termos de reportagem em palcos internacionais, não dispenso a consulta permanente ao "Kevin Sites in the Hot Zone", o blogue alimentado diariamente pelo jornalista Kevin Sites, em http://hotzone.yahoo.com.
- Qual foi o maior impacto que os blogues tiveram na sua vida pessoal?
Muito pouco, isto tendo em conta que impacto talvez seja um termo demasiado forte para aplicar neste contexto. Enquanto jornalista, encaro os blogues como mais uma artéria saudável, que nasce em consequência da evolução (vulgarização) da própria Internet e que pode potenciar a cidadania participativa.
- Acredita que a blogosfera é uma forma de expressão editorialmente livre?
Em teoria sim. No entanto, há que ter em conta que a blogosfera evoluiu já para áreas como a política, o mundo empresarial e o associativismo, isto para dar apenas alguns exemplos. Enquanto meio de comunicação individual, um blogue é uma ferramenta claramente com características de expressão editorial livre, só deixa de o ser quando falamos de blogues de empresas ou de grupos políticos, onde há linhas editorial com objectivos claros.
e
Nos posts de baixo: entrevistas a Carlos Zorrinho, Jorge Reis-Sá, Nuno Magalhães, José Luís Peixoto, Carlos Pinto Coelho, José Quintela, Reginaldo de Almeida, Filipa Abecassis, Pedro Baganha, Hans van Wetering, Milton Ribeiro, José Alexandre Ramos, Paulo Tunhas, António Nunes Pereira, Fernando Negrão, Emanuel Vitorino, António M. Ferro, Francisco Curate, Ivone Ferreira, Luís Graça, Manuel Pedro Ferreira, Maria Augusta Babo, Luís Carloto Marques, Eduardo Côrte-real, Lúcia Encarnação, Paulo José Miranda, João Nasi Pereira, Susana Silva Leite, Isabel Rodrigues, Carlos Vilarinho, Cris Passinato, Fernanda Barrocas, Helena Roque, Maria Gabriela Rocha, Onésimo Almeida, Patrícia Gomes da Silva, José Carlos Abrantes, Paulo Pandjiarjian, Marcelo Bonvicino, Maria João Baltazar, Jorge Palinhos e Susana Santos. Na próxima segunda-feira, dia 23 de Outubro: Manuel Pinto Director do Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade, da Universidade do Minho.

quinta-feira, 19 de outubro de 2006

Retrovisor - 1

e
Extractos de posts que dão conta do olhar (prevenido ou desprevenido) do blogger sempre que contempla pelo retrovisor a paisagem da blogosfera
e
um gajo, pra ter sempre razão/ Só tem de se queixar às pessoas certas. Queixar-se do chefe aos colegas, dos colegas à familía, da família ao marido, do marido às amigas, das amigas aos amigos, dos amigos ao médico, do médico à funcionária, da funcionária ao chefe e do que sobra ao blog.” Isabel R. (17/10/06)
e
Ficha Técnica
Qualidade da vista: Límpida
Estado do viajante: Prevenido
Tipo de espelho: Convexo-generoso
Tom (linguagem vs. rede): Entre Vivace e Presto
Outras impressões: Ver para ter razão, acertar alvo a alvo para expiar demónios, condensar a voz para melhor desabafar. Interessante o modo como o blogger se descreve enquanto espreita pelo retrovisor: "um gajo", i.e., em Inglês "One". Um impessoal pessoalizadíssimo. Fórmula gramatical antitética e também muito portuguesa (dá para dizer "eu" e "todos" ao mesmo tempo). Sobra o "queixume" paródico, o véu aberto, o jorro, o fio da palavra. O post tem o sabor de um olhar pelo retrovisor em hora de ponta. A blogosfera nem sempre se vê a si mesma como um idílio.

Jacqueline du Pré

e
Faz hoje 19 anos - corria o ano de 1987 -, estava a ouvi-la e a escrever ao mesmo tempo o meu terceiro romance, No Princípio Era Veneza (sairia depois na Vega em 1990). Nessa altura, Jacqueline du Pré era uma companhia habitual que eu frequentemente escolhia naquele microcosmos entre a folhagem incerta do quintal e as cortinas claras - pareciam velas - que davam para a Palmstraat. Estava a chover como hoje, tinha chegado de Utreque com um saco de compras e lembro-me que coloquei o vinil no gira-discos (também se dizia correntemente, na "aparelhagem"). Era Haydn - uma sonoridade que dava ao ar a espessura de uma lâmina - e, pouco depois, às seis horas, no "Six O'Clock News from the BBC" (parece que estou ainda a ouvir a voz londrina que anunciava o meu jantar) a notícia da morte de Jacqueline surgiu do nada e eu fiquei subitamente estarrecido. E fixei o dia até hoje.

Mini-entrevistas - 43

e
O Miniscente continua a publicar uma série de entrevistas acerca da blogosfera e dos seus impactos na vida específica dos próprios entrevistados. Hoje a convidada é Susana Santos, Chefe do Departamento de Relações Externas do El Corte Ingés em Portugal.
e
- O que é que lhe diz a palavra “blogosfera”?
Diz-me que há por aí um mundo virtual inteiro que me passa ao lado. Diz-me também que devemos descobri-lo antes que os que nele habitam nos descubram a nós. O descobridor é, também, por definição e deformação histórica, um conquistador e, se assim for, felizes daqueles que dominam esse admirável mundo paralelo.
- Seguiu algum acontecimento nacional ou internacional através de blogues?
Acontecimento propriamente dito não, mas procurei seguir as opiniões que se formaram nalguns blogues acerca desses acontecimentos. Procuro sobretudo aceder às opiniões escritas “a quente”, aos desabafos, às dúvidas dos escritores de blogues, de modo a sentir os impactos que geram determinados factos, sejam políticos, sejam sociais ou culturais.
- Qual foi o maior impacto que os blogues tiveram na sua vida pessoal?
Não falaria em impacto, mas antes em mudança lenta e, sobretudo, bem mais lenta do que o aconselhável (como é já reduzido o termo "lento". Chegou a ter séculos e agora já só tem um par de anos!). Tratando-se de uma realidade que, em Portugal, não terá mais do que três a quatro anos enquanto fenómeno generalizado, confesso que só ao longo dos últimos dois anos tomei consciência da sua importância e, sobretudo, das dúvidas por ele suscitadas, já de ordem ética, já de orientação profissional.
- Acredita que a blogosfera é uma forma de expressão editorialmente livre?
A expressão “editorialmente livre” parece indiciar a ausência de quaisquer peias ou critérios editoriais susceptíveis de censurar os conteúdos, pelo que, deste ponto de vista limitado, diria que sim, que é editorialmente livre. Contudo, tratando-se de uma forma de expressão e de comunicação tão extraordinariamente individualista e, portanto, dissemelhante, tantas vezes pouco informada e, na maioria das vezes simplista, é difícil qualificá-la como reduto da liberdade de expressão. Diria que contém a singular particularidade de o ser e de o negar, conforme tenha ou não a capacidade de serem livres os seus autores e, sobretudo, os seus leitores.
e
Nos posts de baixo: entrevistas a Carlos Zorrinho, Jorge Reis-Sá, Nuno Magalhães, José Luís Peixoto, Carlos Pinto Coelho, José Quintela, Reginaldo de Almeida, Filipa Abecassis, Pedro Baganha, Hans van Wetering, Milton Ribeiro, José Alexandre Ramos, Paulo Tunhas, António Nunes Pereira, Fernando Negrão, Emanuel Vitorino, António M. Ferro, Francisco Curate, Ivone Ferreira, Luís Graça, Manuel Pedro Ferreira, Maria Augusta Babo, Luís Carloto Marques, Eduardo Côrte-real, Lúcia Encarnação, Paulo José Miranda, João Nasi Pereira, Susana Silva Leite, Isabel Rodrigues, Carlos Vilarinho, Cris Passinato, Fernanda Barrocas, Helena Roque, Maria Gabriela Rocha, Onésimo Almeida, Patrícia Gomes da Silva, José Carlos Abrantes, Paulo Pandjiarjian, Marcelo Bonvicino, Maria João Baltazar e Jorge Palinhos. Amanhã: Miguel Martins, jornalista.

quarta-feira, 18 de outubro de 2006

Retrovisor

e
Extractos de posts que dão conta do olhar (prevenido ou desprevenido) do blogger sempre que contempla pelo retrovisor a paisagem da blogosfera
e
Já estão seleccionados 50 extractos de posts para iniciarmos a nova rubrica. A banda larga de escolha está a ser a da minha lista de links, tendo começado a pesquisa de baixo para cima, mais concretamente desde o blogue do Paulo José Miranda, A Voz Que Nos Trai - último da lista - até ter chegado há minutos ao blogue de Paulo Querido, Mas Certamente Que Sim. Continuarei até ao primeiro da lista e depois percorrer-se-ão ainda outras vias. Este post é um teste de imagem da nova rubrica que espera poder levar o Miniscente à boleia até Janeiro de 2007.
e
A ficha técnica do Retrovisor constará dos seguintes elementos:
e
1 - Tom (linguagem vs. rede):
Grave: vagarosamente e solene
Largo: Largo e severo
Lento: Lento qb.
Adagio: Vagaroso e recheado de pathos
Andante: Velocidade do andar humano. Elegância
Andantino: Andar ligeiro, compassado e agradável
Moderato: Nem rápido, nem lento: tom ajustado
Allegro: Ligeiro e alegre
Vivace: Rápido e vivo
Presto: Veloz e animado
2 - Qualidade da Vista:
límpida
baça
obstruída
reflectida
3 - Estado do viajante:
prevenido
desprevenido
4 - Tipo de Espelho:
côncavo-narcísico
convexo-generoso
liso-neutro
e ainda... (5-) Outras impressões
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Retrovisor começa amanhã, dia 19/10/2006.

Blogues e Meteoros

e
Hoje, no Expresso online:
e r r
O novo niño mimado de la historia humana?
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Há uma questão que qualquer analista de blogues devia colocar a si próprio: que espaço existiria há alguns anos que, hoje em dia, os blogues tenham passado a ocupar? Ou será que um espaço totalmente novo se veio apenas acrescentar a outros espaços já existentes?
Creio que a blogosfera veio maioritariamente responder a horizontes anteriormente existentes, embora tenha também alargado o horizonte com que nos debatemos e exprimimos no quotidiano.
Comecemos pelo primeiro caso. A blogosfera veio de facto ocupar:
1 - O que antes era um espaço de silêncio que se desenvolvia de modo vertical entre alguns emissores localizados e uma vasta cadeia de auditórios (o tempo de incubação e interpretação de um livro, de um filme, de textos publicitários, do discurso político, etc. que hoje aparece a cruzar a meteórica miscelânea temática dos blogues).
2 - O que antes era um espaço apenas potencial de interacção que vivia contido pela própria natureza dos media tradicionais (a reacção face à televisão, face aos espaços de crónica ou face à própria sintaxe das notícias/ imagens que hoje preenchem boa parte dos discursos activos e plurais que se enunciam nos blogues).
3 - O que antes constituía um espaço crítico a partir do qual se descreviam coloquialmente – era “matéria de botequim” – certos mundos de cariz muito empírico (as viagens, os lazeres domésticos, breves reflexões, notas casuísticas, enfim, pequenos actos do dia a dia que hoje aparecem intensamente transpostos em conteúdos da blogosfera).
Passemos ao segundo caso. A blogosfera veio também realmente acrescentar horizonte aos nossos horizontes, sobretudo pelo facto de ter aberto a possibilidade de existência ao que, hoje em dia, pode ser já caracterizado como sendo a “cidadania expressiva” (um imenso jorro “telepático” global que carece ainda de uma adequação das linguagens tradicionais às estruturas do novo meio). Este novo redimensionamento dos horizontes expressivos corresponde a um espaço potencial que anteriormente não estava a ser desenvolvido por diversas razões, sendo as principais o controlo apertado dos mecanismos de edição e o desfasamento entre o desejo de iniciativa expressiva e os meios que a pudessem tornar massificadamente possível. Existirá uma interessante analogia entre este caudal de novas escritas e “escritores” (o número de blogues não deixa de crescer no mundo de modo exponencial) e o final da censura que, no caso português de há trinta e dois anos, toda a inteligentsia pensou que viria acompanhado do anúncio de um número ímpar de obras de qualidade até então ofuscadas do público. Se hoje se sabe que este último facto se traduziu afinal no verdadeiro mito de Abril de 1974 (pondo de lado uma meia dúzia de honrosas excepções), também se pode afirmar que, no caso dos blogues, a optimização massificada da expressão não logrou tornar visíveis, até hoje (salvo a mesma meia dúzia de excepções), novos “génios” anteriormente ofuscados pelo “sistema”.
Ortega Y Gasset percebeu muito bem no seu tempo que muitas vozes que nunca tinham aparecido antes no espaço público haviam subitamente começado a singrar. E baptizou-as, sem grandes ironias (La Rebelión de las masas, 1939), como a voz do “señorito satisfecho” ou do “niño mimado de la historia humana”. Adoraria saber como é que Ortega baptizaria, nos tempos que correm, este novo caudal que procura sagaz e desesperadamente o core de uma renovada expressão.
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Outro Blogues e Meteoros (o Nº5) que me esqueci de publicar no Miniscente (ver aqui no Expresso online):
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De licra lilás como a Madonna
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Muitos portugueses gostariam de ser como o King Kong: peito ainda mais peludo, força instigadora e narinas de intimação para o que desse e viesse. O fenómeno é óbvio quando se olha para o trânsito do nosso país: face aos erros dos outros, os portugueses reagem em cadeia e vociferam como se fossem um híbrido entre o escuteiro impoluto e o vitoriano indignado.
Haveria razão para tais enfados, se todos os portugueses fossem polícias de trânsito, ou se todos estivessem no lugar da consciência dos faltosos, ou ainda se fossem sempre vítimas dos actos destes. Mas mesmo não sendo polícias, nem fantasmas de mentes alheias, nem sequer vítimas, os portugueses continuam a insistir nesta prática. Todos os dias. É coisa que lhes está no sangue.
No fundo, adorariam ter perseguido Jack, o estripador. No fundo, gostariam que a sua consciência fosse sempre a dos outros (criar-se-ia assim um mundo de criaturas liliputianas a dançar sobre uma caixinha que reproduziria sempre a mesma música). No fundo, gostariam de ter sido sempre vítimas, de acarretar culpas pesadas e de se queixarem a tempo inteiro dos infortúnios do destino.
Estas três características do King Kong “português suave” poderiam condensar-se numa única imagem. Imaginemo-la como uma espécie de Júlio César vestido de licra lilás como a Madonna a ler versos de Teixeira de Pascoaes de manhã à noite (ou então, numa versão menos intelectual, a devorar a aura do Padre Sousa Martins). Creio que é um retrato robô bastante aproximado do português inconsolado com o caos do trânsito que, ao fim e ao cabo, ele próprio tanto adula e pratica.
Se colocarmos lado a lado o trânsito e a blogosfera, numa espécie de alegoria menor, é bem possível que ao português inconsolado com o trânsito corresponda um novo tipo de voyeur da blogosfera que anda, aliás, muito em voga.
O retrato robô desse novíssimo voyeur – que acumula também as funções de escuteiro vitoriano – é claro e não tem quaisquer segredos: diz que nunca leu blogues, ou então, se os leu, foi por brevíssimo lapso e tão-só para confirmar a demência informe que os percorre de lés-a-lés e sem excepção.
Pode ser um jornalista com dores da tarimba. Pode ser um académico que trocou a especialização pela cor das joaninhas. Como pode ainda ser o simples desempregado de causas maiores: desses que de tanto sonhar se tornaram na bela adormecida, embora sem terem reparado, tal como Pessoa avisou, que eram eles mesmos “A princesa que dormia”.
A desconfiança face à cidadania electrónica é um sintoma cristalino da excitação destes nossos King Kongs lusitanos (o “Velho do Restelo” não teria o encanto de quem parte a porcelana toda). Por outras palavras e regressando à alegoria: à medida que as novas formas de cidadania se consolidam, neste novo mundo cada vez mais descentrado e aberto, mais a caravana passa e o escutismo impoluto vocifera com a força de um nada. É por isso que, sensivelmente a meio do seu último romance, A Possibilidade de uma ilha, Houellebecq dá a Vincent Greilsamer – personagem meio iniciática – as seguintes palavras: “A única coisa que não é Kitsch é o nada”.
e
3
Para a próxima semana, anuncia-se no Expresso online a crónica "A profecia da ciberpoética".

terça-feira, 17 de outubro de 2006

Mini-entrevistas - 42

e
O Miniscente continua a publicar uma série de entrevistas acerca da blogosfera e dos seus impactos na vida específica dos próprios entrevistados. Hoje o convidado é Jorge Palinhos, tradutor.
e
- O que é que lhe diz a palavra “blogosfera”?
Define-me um conceito muito interessante de fanzine electrónica de alta interactividade e imediatez, em que grupos de interesses específicos partilham rumores e novidades e criam sinergias. As fanzines em papel já se caracterizavam por tudo isso, mas os weblogs vieram tornar o processo mais rápido e global.
- Seguiu algum acontecimento nacional ou internacional através de blogues?
Quase todos. Independentemente dos defeitos do meio (enviesamento ideológico, superficialidade, impulso demagógico) é um dos melhores recursos para descobrir informação muitas vezes só subentendida ou mesmo omitida nos media tradicionais.
- Qual foi o maior impacto que os blogues tiveram na sua vida pessoal?
Deram-me dois ou três anos de muita prática de escrita e o contacto com pessoas com quem partilho afinidades, que de outro modo não conheceria. Foi também, e continua a ser, uma modo importante de aprendizagem e alargar de horizontes culturais e pessoais.
- Acredita que a blogosfera é uma forma de expressão editorialmente livre?
Não. A não ser nos blogs secretos, há sempre o peso editorial de quem lê - muitas vezes são amigos, familiares ou colegas de trabalho, com quem há sempre uma imagem a salvaguardar. Já para não falar do peso da auto-edição, que é uma questão muitíssimo delicada. Quantos se atrevem a passar a escrito uma versão crua e desapiedada da sua vida e personalidade?
e
Nos posts de baixo: entrevistas a Carlos Zorrinho, Jorge Reis-Sá, Nuno Magalhães, José Luís Peixoto, Carlos Pinto Coelho, José Quintela, Reginaldo de Almeida, Filipa Abecassis, Pedro Baganha, Hans van Wetering, Milton Ribeiro, José Alexandre Ramos, Paulo Tunhas, António Nunes Pereira, Fernando Negrão, Emanuel Vitorino, António M. Ferro, Francisco Curate, Ivone Ferreira, Luís Graça, Manuel Pedro Ferreira, Maria Augusta Babo, Luís Carloto Marques, Eduardo Côrte-real, Lúcia Encarnação, Paulo José Miranda, João Nasi Pereira, Susana Silva Leite, Isabel Rodrigues, Carlos Vilarinho, Cris Passinato, Fernanda Barrocas, Helena Roque, Maria Gabriela Rocha, Onésimo Almeida, Patrícia Gomes da Silva, José Carlos Abrantes, Paulo Pandjiarjian, Marcelo Bonvicino e Maria João Baltazar. Na próxima Quinta-feira (19/10): Susana Santos, Chefe do Departamento de Relações Externas do El Corte Ingés em Portugal.

Brevemente

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Depois do "Tom dos Blogues", dos aforismos de "Férias" e das "Mini-entrevistas" - ainda em curso -, o Miniscente está quase a dar à luz o "Retrovisor". Na nova secção, o blogger desprevenido vai ser exposto no modo como olha para a blogolândia, enquanto circula na larguíssima via que parece disseminar-se em todos os sentidos e mais um.

segunda-feira, 16 de outubro de 2006

Mini-entrevistas - 41

e
O Miniscente continua a publicar uma série de entrevistas acerca da blogosfera e dos seus impactos na vida específica dos próprios entrevistados. Hoje a convidada é Maria João Baltazar, professora de fotografia e investigadora.
e
- O que é que lhe diz a palavra "blogosfera"?
A palavra "blogosfera" diz-me, somente, aquilo de que é formada: junção de "blog" com o planeta esférico que temos como nosso; um conjunto muito vasto de sujeitos e com possibilidade de crescimento por filiação diária, todos a comentar e pensar o melhor que podem (isto sendo optimista, caso contrário são "lançadas opiniões" cujo interesse se resume a uma ausência de critérios do "falar sobre o que seja com qualquer um"...). Verdade seja dita há blogs e blogs! Esta afirmação tem muito interesse porque, se efectivamente há boas intenções comuns entre pessoas inteligentes, o que se afirmou é também opinião de senso comum e o senso comum é o que de mais comum se pode encontrar para entreter o tempo de tardes chuvosas.
- Seguiu algum acontecimento nacional ou internacional através de blogues?
Qual ovelha desgarrada no seu tempo, limito-me a seguir (e ainda assim sem exageros) jornais de fim-de-semana e dia sim, dia não um noticiário.
- Qual foi o maior impacto que os blogues tiveram na sua vida pessoal?
Quase nulo. Outros enviam links significativos que se vão lendo, por vezes esquecidos ao mesmo tempo. Mas lá fica uma referência e descobrem-se artigos, livros que se podem adquirir numa maravilhosa livraria on-line.
- Acredita que a blogosfera é uma forma de expressão editorialmente livre?
Acredito que é uma forma de expressão não controlável. Acredito que aquilo que se vai expressando é desordenado, sem selecção, escolha, triagem, está lá tudo. O que quer que seja, se existir, existirá por lá.
e
Nos posts de baixo: entrevistas a Carlos Zorrinho, Jorge Reis-Sá, Nuno Magalhães, José Luís Peixoto, Carlos Pinto Coelho, José Quintela, Reginaldo de Almeida, Filipa Abecassis, Pedro Baganha, Hans van Wetering, Milton Ribeiro, José Alexandre Ramos, Paulo Tunhas, António Nunes Pereira, Fernando Negrão, Emanuel Vitorino, António M. Ferro, Francisco Curate, Ivone Ferreira, Luís Graça, Manuel Pedro Ferreira, Maria Augusta Babo, Luís Carloto Marques, Eduardo Côrte-real, Lúcia Encarnação, Paulo José Miranda, João Nasi Pereira, Susana Silva Leite, Isabel Rodrigues, Carlos Vilarinho, Cris Passinato, Fernanda Barrocas, Helena Roque, Maria Gabriela Rocha, Onésimo Almeida, Patrícia Gomes da Silva, José Carlos Abrantes, Paulo Pandjiarjian e Marcelo Bonvicino. Próxima entrevista (Terça-feira, 17/10): Jorge Palinhos, tradutor.

domingo, 15 de outubro de 2006

Os grandes portugueses

e
Para além de alguns esquecimentos mais ou menos sérios ou paródicos (D. Pedro I, Manuelinho de Évora ou João de S. Tomás - no mundo anglo-saxónico, John Poinsot), houve uma gralha realmente lamentável no novo programa da RTP, Os Grandes Portugueses: ao falar-se de Aristides de Sousa Mendes, a emissão esqueceu-se de soletrar em voz alta o próprio nome de Aristides de Sousa Mendes. De resto, o mais interessante centrou-se - e ir-se-á centrar doravante - na adequação das pessoas que vão sendo chamadas a depor. É um pouco como naqueles concursos de dança de salão ou de canto estilo Karaoke: nem sempre a alta ciência vive do registo de invariantes, quanto mais os processos de oniromancia!

O espectro da Venezuela

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Escreve-se hoje no excelente Notas Verbais (e valerá amanhã seguir os episódios que aqui se anunciam):
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"Nesta Segunda-feira, em Nova Iorque, é a primeira volta da eleição pela Assembleia Geral da ONU dos novos membros não permanentes do Conselho de Segurança para o biénio 2007-2009, com contagem de votos dos 192 Estados a cargo da Hungria, Suiça, Brunei, Chile e Quénia.
e
Passam à primeira volta – oito canditados para cinco vagas – os países que obtiverem dois terços de votos. Argentina, Dinamarca, Grécia, Japão e Tanzânia terminam no final de 2006 os respectivos mandatos cedendo lugares.
e
Venezuela e Guatemala (pelo Grupo de Estados da América/Caraíbas) protagonizam luta a luta mais renhida para ocupar o lugar a ser deixado pela Argentina. Chávez (ontem mesmo a chancelaria de Caracas emoldurou entusiasmo inusitado) assegura que o seu país conseguirá, logo na primeira volta, apoio de dois terços dos 192 membros da ONU, para o qual contará com o respaldo da Liga Árabe, Rússia, China, Irão, Cuba, países do Mercosul (designadamente do Brasil), e ainda de boa parte dos Estados da União Africana – o Chile diz que revela o seu voto sobre a eleição. A Guatemala tem o apoio dos EUA – em entrevista a The Wall Street Journal, no final de Setembro, Condoleezza Rice considerou que entrada da Venezuela no Conselho de Segurança da ONU paralisaria este órgão e que ditaria «o fim do consenso».
e
A Guatemala nunca esteve no Conselho de Segurança por onde a Venezuela já passou por quatro vezes (a última vez no biénio 1995-96)
e
Indonésia, Coreia do Sul e Nepal, por sua vez, disputam a vaga do Grupo Asiático a ser deixada deixada pelo Japão.
e
Nepal e Indonésia, duas vezes no Conselho de Segurança; Coreia do Sul uma única vez (1995-96)
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África do Sul é o único candidato africano a prestar-se para render a Tanzânia.
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A África do Sul nunca foi eleita para o Conselho de Segurança
e
Bélgica e Itália são também os únicos contendores do Grupo Europeu Ocidental (para os lugares a vagar pela Dinamarca e Grécia).
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A Bélgica cumpriu já quatro mandatos (o último em 1991-92) e a Itália teve cinco presenças (última em 1995-96)
e
Eslováquia, Qatar, Peru, Gana e Congo terminam mandatos no final de 2007. Portugal só deve revelar o sentido de voto (sobretudo entre Venezuela/Guatemala) terminada a contagem ou conhecidos os resultados. Não será assim, Embaixador João Salgueiro?"

sábado, 14 de outubro de 2006

Nobel

e
Li uma boa parte de A Cidadela Branca do novo prémio Nobel, Orhan Pamuk, e reconheço mais uma vez que há aqui grande teatro de sombras. No fundo, há muito que se sabe que é esta a lógica do Nobel: convocar nomes significativos nos interfaces políticos (com perspectivas também cada vez mais óbvias) em vez de sublinhar a riqueza da intemporalidade literária. Qualquer dos autores que li nas férias de Agosto suplantam de longe a escrita, o plot e a plasticidade do discurso de Pamuk (que pude desvendar até agora, embora a intuição nestas coisas raramente me traia): Banville, Rushdie, Roth, McEwan ou até o por cá mal amado Houellebecq. Nos dias que se seguem - o cortejo já começou - vão aparecer nos ecrãs uns cinzentões glutões a repetir, com ar pleno de verosimilhança, a pertinência da sagesse que prolifera na "Academia" sueca e a intelligentsia ficará de imediato enternecida. É tiro e queda almofadada. Tenho que ver se ganho o Nobel também. Já faltou mais.

sexta-feira, 13 de outubro de 2006

Treze

Av. D. Carlos I
~e
Fiquei hoje a saber que a Sexta 13 tem a sua origem num decreto francês (claro!) que, em 1307, estipulava a extinção dos Templários. A França é um país que adora resolver tudo, mesmo o que não lembra ao diabo, através do peso da lei e da eminência lívida e impessoal do estado. A coisa vem de longe. Para mim, a Sexta 13 foi ontem: vi-me num choque em cadeia, vi-me sem carro e vi-me a subir com malas de viagem a pé da D. Carlos até Campo de Ourique. Iniciação espartana, dir-se-á. Além do mais, quase sem transportes, Lisboa ficou ontem imobilizada devido à manifestação da Intersindical que não passou de um enquadramento de milhares de pessoas em autocarros e mais autocarros, cuja espontaneidade e autenticidade políticas deixam muito a desejar, na medida em que toda gente sabe - hipocrisias de lado - que a encenação destes cortejos é obra omnia do PCP (com aquela aura paternalista de quem fala em nome dos "trabalhadores", como se só os ditos ditassem a validade do que é, ou não, ser trabalhador). Por que não se enquadra, nestes casos, a mais do que legítima liberdade de expressão num dos estádios de Lisboa? Já é tempo de alargar o “Basta” socrático ao Dr. Jardim à lógica destes passeios alegres que parecem ter como finalidade, não tanto protestar demagogicamente contra reformas inevitáveis que todos os governos têm adiado, mas prejudicar o quotidiano já difícil e complicado das pessoas. Ontem, à parte a insignificância do que comigo se passou, pude claramente testemunhar esse facto.

quinta-feira, 12 de outubro de 2006

Mini-entrevistas - 40

e
O Miniscente continua a publicar uma série de entrevistas acerca da blogosfera e dos seus impactos na vida específica dos próprios entrevistados. Hoje o convidado é Marcelo Bonvicino, estudante de letras na Universidade de São Paulo, 19 anos.
e
- O que é que lhe diz a palavra “blogosfera”?
Muito mais do que simplesmente o universo dos blogues. A “blogsfera” é uma esfera de livre (parcialmente) circulação e interação entre idéias. Suspenso em relação às instituições privadas e governamentais, reafirma o direito de expressão e possibilita a descoberta de novas ideias, muitas vezes barradas pela mídia formal e da divulgação, mais livre e espontânea, de cultura, política e arte, de forma plural e internacional. Além disso, os blogues inovaram o conceito de escrita, já que dão ao leitor a possibilidade de quebrar a linearidade textual, permitindo-o vagar ao sabor do vento, através de diferentes cessões e links dentro das páginas. Outra grande vantagem deles é a sua dimensão, muito vasta, que obriga ao leitor a rastrear o ambiente à procura do que deseja, movimentando o fluxo de idéias.
- Seguiu algum acontecimento nacional ou internacional através de blogues?
Sim. Acompanho comentários sobre diversos eventos e acontecimentos nacionais e internacionais, embora, muitas vezes prefiro acompanhar tais eventos através da mídia, por conta de sua maior praticidade. Os blogues são, por vezes, muito dispersos, sendo melhor aproveitáveis na minha opinião, para a divulgação de idéias, não de fatos propriamente ditos.
- Qual foi o maior impacto que os blogues tiveram na sua vida pessoal?
Através dos blogues, foi possível produzir projetos e textos para publicação menos formais, tornando-se uma área de pré-projeção e discussão de idéias. Uma excelente maneira de expor textos, imagens e pensamentos a grupos menores de pessoas e sem a responsabilidade exigida pelas editoras, jornais, etc. Além disso, foi possível criar ou reforçar vínculos intelectuais e de amizade com pessoas de diversos grupos. Para mim, blog é um excelente exercício de liberdade e de criação, dele eu posso desenvolver projetos mais concretos com maior segurança. Funcionam como zonas autônomas temporárias, aonde uma idéia (ou várias) se assemelha a um “hapenning”, adquire o status de ‘fato’, acontece, repercute (no meu caso muito pouco, rs...) e se esvai no tempo. Entra para uma espécie de biblioteca da rede, podendo, nesta, perder-se ou não.
- Acredita que a blogosfera é uma forma de expressão editorialmente livre?
Não necessariamente. Principalmente a partir do momento em que foi invadida pela publicidade. Vejo como um uma forma editorialmente alternativa. Uma nova concepção de editoração. Pois, quando há um informe de teor publicitário entre as idéias expostas, a liberdade é parcialmente tolhida. Ora, todos sabemos que os mecanismos publicitários atuam no intuito de impor valores e idéias. Imposição é a negação da liberdade. Entretanto, tal esfera funciona como um nicho, menos valorizada pela sociedade e pelo mercado como forma de expressão, o que necessariamente gera uma maior liberdade. Não completa, mas maior.
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Nos posts de baixo: entrevistas a Carlos Zorrinho, Jorge Reis-Sá, Nuno Magalhães, José Luís Peixoto, Carlos Pinto Coelho, José Quintela, Reginaldo de Almeida, Filipa Abecassis, Pedro Baganha, Hans van Wetering, Milton Ribeiro, José Alexandre Ramos, Paulo Tunhas, António Nunes Pereira, Fernando Negrão, Emanuel Vitorino, António M. Ferro, Francisco Curate, Ivone Ferreira, Luís Graça, Manuel Pedro Ferreira, Maria Augusta Babo, Luís Carloto Marques, Eduardo Côrte-real, Lúcia Encarnação, Paulo José Miranda, João Nasi Pereira, Susana Silva Leite, Isabel Rodrigues, Carlos Vilarinho, Cris Passinato, Fernanda Barrocas, Helena Roque, Maria Gabriela Rocha e Onésimo Almeida, Patrícia Gomes da Silva, José Carlos Abrantes e Paulo Pandjiarjian. Próxima entrevista (segunda-feira, 16/10): Maria João Baltazar, professora de fotografia e investigadora.

Lua minguante

A reciclagem nas histórias pessoais não é muito diferente das reciclagens nas histórias “colectivas”. Ambas são permanentes, movem-se na maior parte das vezes por gestos que ultrapassam o cálculo imediato e transformam o vivido numa súmula dispersa de anonimatos.

quarta-feira, 11 de outubro de 2006

É ele, não sou eu!

À lupa: em baixo, o meu irmão está à esquerda e, na fotografia do 4ºB do Liceu (1967-1968), eu estou por cima da careca do poeta Albano Martins e o meu irmão é o segundo do lado direito. Em cima: a volta ao mundo em bicicleta.
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Dizem que somos muito parecidos, mas não, não sou eu. É o meu irmão, o José Manuel Carmelo; ele é que é o cientista, o físico, e é por isso, por ter ligações ao MIT (acabou há pouco tempo uma estadia de um ano por lá) que tem estado hoje a ser entrevistado. Depois do telejornal da 13h, vai estar na RTP-N entre as 18h e as 19h. Mais, para já, não sei.

Inquinamento futebolístico

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O discurso sobre o futebol é necessariamente um discurso apaixonado, de arroubo. Não se poderia nunca falar e viver o futebol com um discurso baseado no Logos. O futebol é uma asa aberta que convoca o Mito e o Pathos, mas nunca o Logos. Quem não o entender – e estará no seu legítimo direito – age como se estivesse a falar pausadamente sobre a poesia de Eugénio de Andrade nos minutos que precedem uma final da Taça de Portugal no Jamor. Imagine-se o que seria. Vem isto a propósito dos jogos inquinados. No fundo, não há jogo – mesmo se o jogo for de linguagem - que não seja inquinado, isto é: pulverizado por mal-entendidos, por pequenas ou grandes rasteiras, por fingimentos e sobretudo por violação ou oscilação das regras (é essa a base da criação de sentido). No futebol, no entanto, tudo se amplia. E quem gosta do desporto rei já sabe que, quando se entra num estádio, fisicamente ou por outros meios (áudio ou TV), os códigos que moldam apupos e encómios são de uma natureza totalmente diferente daqueles que se respiram no ‘outro lado’ da vida. Embora as coisas se toquem. Tocam-se sempre, aliás. No Portugal-Rússia em duas mãos que ontem terminou houve vantagens ilegais simétricas: no primeiro jogo, os russos beneficiaram de uma estranha expulsão na equipa adversária e de uma grande penalidade duvidosa; no segundo jogo, os portugueses beneficiaram de uma estranha expulsão na equipa adversária e de uma grande penalidade duvidosa. No final, venceu quem marcou um golo fora: foi essa a regra que aparentemente imperou. De um modo frio – escalonando argumentos e aspirando a conclusões tendo como base apenas o raciocínio (i.e., recorrendo ao Logos) – dever-se-ia colocar no centro da análise esta bizarra simetria e o modo como os árbitros (de Chipre e da Holanda, respectivamente) se comportaram e porquê. Mas como não é essa a lógica do discurso do futebol, ficamo-nos pelo tom épico e de panegírico. Como passou a ser moda afirmar nos últimos anos: “É assim”. (confissão final parentética: curiosamente, no meu caso, consigo ser bastante frio na análise dos jogos de selecções, mas vibro com efusão e puro Pathos no futebol de clube sempre que o meu, o inevitável “Glorioso”, entra em cena).