quinta-feira, 31 de março de 2005

Revista Brasileira

Antes de pensar em partir de avião, nada melhor do que sobrevoar a letra de alguns dos blogues brasileiros que mais frequento. Há sempre eclectismo e rasgo q.b. que superam a modorra da nostálgica praia lusitana.

O Alexandre Soares Silva começa por nos segredar uma espécie de tratado sobre como melhorar os ventos literários. Por cá, garanto, essas palavras foram lidas com suma atenção:

"(...)a maior parte dos livros, não só da literatura brasileira, mas da literatura mundial, melhoraria muito se tivesse pelo menos um dos seguintes elementos: um crime num quarto fechado, um detetive excêntrico, um gorila, um gigante, um duelo, um fantasma, uma ninfomaníaca – é triste a falta de ninfomaníacas na literatura da catinga – um pirata, um corsário, um chinês malvado, uma batalha naval, um homem atormentado treinado para matar usando objetos do cotidiano (como canudinhos) e, sei lá, diagramas de Go. Eu também gosto muito de romances com mapas de cidades, ou planos de casas ou palácios. Olá."

Já agora, após esta avalhanche meteórica, uma notícia triste: a 27 de Março acabou um grande blogue, o Literatus.
Andrea: como é que foi isso possível? Explique-se lá!

A Prosa Caótica, por seu lado, deu-nos a ver, num dia destes, o outro lado da escrita. Por imagens:

Há inscrições e inscrições. Esta soa a vida, a lisura, a liquidez adiada. Embora a folha branquíssima e marmórea de Mallarmé esteja, neste caso, bem calçada e dobradinha.

O Alfarrábio de Paulo Bicarato dá-nos uma lição de música que bafeja novidade:

"Domingão à noite, depois da reunião de família, tradicional na Páscoa, e eu começo a dar uma zapeada na TV. Gratíssima surpresa dar de cara com o Ensaio, da TV Cultura, que trazia o (até então desconhecido) Grupo Arirê. Quatro moças mais-do-que-simpáticas, com vozes e repertório de primeiríssima linha. Fiquei fã da Gabriela Rossi, Mônica Olivetti, Selma Boragian [foto] e Virgínia Rietmann —o quarteto feminino que se dedica basicamente à execução de Música Popular Brasileira de bom nível, acompanhadas geralmente por violão e percussão. O que caracteriza os arranjos vocais e as interpretações do Arirê são a criatividade e o refinamento."

Agora que a música é uma moda viva da blogosfera portuguesa (A Ursa também já entrou na moda e até esclareceu que o "Raibow Lorikeet é uma espécie de periquito colorido"), nada melhor do que esta actualização.

A Maria, "futucando-me" ontem (obrigado!), "entre as chuvas de Março fechando o Verão", dá evidência ao óptimo (e, já agora, muito galego) Sovaco de Cristo. Travessias felizes. Vejam bem:

"Futucando a lista de blogs recomendados pelo Luís, encontrei o desde o sovaco de cristo. O autor é um galego que conta as vicissitudes de se morar numa cidade como o Rio. Hilárias as histórias. Reproduzo um texto sobre a inesquecível experiência de se andar de ônibus por aqui. Muito bom !

De ônibus e camelôs

O pior de se sujeitar à inércia do conhecido é que aí se fica realmente à mercê do desconhecido. A primeira vez que subi num ônibus no Rio entrei pela porta dianteira, como se estivesse na Corunha, em vez de o fazer pela porta traseira. O motorista olhou para mim, sem se importar muito, sem se importar nada, na realidade. Meteu primeira, fechou a porta e saiu correndo. Enquanto eu, totalmente perdido, desnorteado, comprovava com vergonha que o cobrador estava na parte de atrás, mão sobre mão, meio dormido. Agarrei-me como pude, assumindo com a maior dignidade possível as olhadas dos passageiros, que se perguntavam alguma coisa que eu daquela nem imaginava. Ninguém me reclamou o dinheiro, a viagem saiu de graça. Também não adiantou nada, estava no ônibus errado."

A Sílvia, por seu lado, continua a produzir o seu infindável intertexto poético como se fosse, ela mesma, a força motriz de uma rebentação sem fim:

"e quando a vida nos deixa os minutos/na mão como se os tivéssemos/colhido há pouco/frescos/mas ainda não saboreados?"


Não sei como responder à tua pergunta. Há sempre um lapso no deambular poético que nos concede apenas o lance do que não é dito.


A confissão mais secreta aparece subitamente no Letteri Café:

"Tenho plena consciência de que não sou o melhor dos pais. Falta agora meus filhos terem a mesma clareza em relação a serem os melhores filhos."

Outro não dito. Águas mais profundas do que pluviais. Mas eis que, contrariando o movimento de intimidades, a Adriana Paiva do Periplus ameaça agora mostrar-nos S. Paulo, feericamente e de moto:

"Nos próximos dias , começo a mostrar aqui essa São Paulo "remapeada" sob medida para meu desejo."

Por fim: Barney Martin é evocado no SubRosa, enquanto as insónias da Tabacaria dão, pela certa, muito trabalho à longínqua herança de Pessoa.