quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

Episódios e Meteoros - 62

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(crónica publicada há uma semana no Expresso Online)
(ver também no meu
blogue de crónicas)
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A nova Expo
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Quando o Outono entra em cena, há um período de limbo que costumo definir como nostálgico. E nunca soube porquê. Nunca descobri se é por causa da definição da luz, se é por causa das memórias balneares da infância, se é por causa do avizinhar do início das aulas, se é por causa da bonança que sucede aos excessos do sol, se é por causa do reaparecer normal das rotinas, se é por causa das folhas caídas dos plátanos, ou se é por causa de alguma antiga e perdida paixão outonal.
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Não sei, não faço ideia, mas sinto-o até ao mais recôndito mapa da minha pele. Como se entrasse em metamorfose e ameaçasse rever-me num ser que nunca fui e num tempo que, antes, afinal, nunca terá chegado sequer a existir. Deve ser isto mesmo a nostalgia: um desafio improvável que tenta acasalar uma sensação extraviada de belo com os passos inseguros e tímidos que acabam sempre por recortar o presente. Deve ser isso que tenho sentido, ano após ano, quando o oceano de Agosto dobra o cabo de Setembro e depois a boa esperança nublada de Outubro.
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Escrevo este texto em Dezembro, quase em cima do Natal, e, portanto, já imune a todos estes enredados estados de alma. Mas o mais curioso é que o país parece ter andado a mimar esta minha estranha metamorfose da nostalgia. Tem sido assim ao longo de todo o Outono, confesso.
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É o documentário sobre a Guerra de África do Joaquim Furtado que disputou audiências a concursos e novelas. É a série Conta-me como foi de Fernando Ávila e Pedro Miguel que passa aos domingos à noite. São os programas de António Barreto (o último versa o contraste entre a televisão que existe e a que existiu). É a história do livro sobre a afilhada de Salazar. Aliás, são todos os livros sobre Salazar e o seu tempo que nunca foi, frise-se bem, apenas o tempo de Salazar. E são lançamentos editoriais. Um deles um romance de guerra (António Brito, Olhos de caçador da Sextante) que o editor, João Rodrigues, referiu como parte desta «onda»: “Testemunho lúcido, preciso e realista, associado a uma estrutura ficcional com ritmo, que prende o leitor. O êxito da série documental de Joaquim Furtado levou-nos a considerar a sua publicação imediata”.
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Enfim, o Outono cobriu Portugal de uma nostalgia ávida e espessa. Forma interessante de glosar o presente. Tudo isto quase dez anos após a Expo. Lembram-se?
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Confesso que sempre tive a sensação de que faltava algo na Expo98.
Deve ter sido, de facto, este pavilhão tardio: o Pavilhão da Nostalgia.
E com esta nota amena vos acompanho até à fogueira do Natal.
Um bom lume, muita saúde e muitos presentes são os meus sinceros votos.