quarta-feira, 29 de março de 2006

Advogado do diabo

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Já deixei a minha opinião sobre o MargaridaGate no post de baixo (antes da perdição de "Complexity and Color"). Mas agora, qual advogado do diabo, sou também levado a perguntar: qual é o problema de um escritor poder reatar e repetir extractos de texto que são seus nos seus próprios livros? Em romance, pode acontecer. Voluntária e sobretudo involuntariamente. Há um genoma incerto que se atravessa no uso próprio da linguagem. E é esse uso que a significa e dá luz ao que geralmente se chama estilo (destesto a palavra). No meu caso, já reparei nisso muitas vezes. Desenvergonhadamente. No caso dos ensaios, então, a coisa torna-se inevitável. Quem desenvolve um pensamento em várias frentes ao longo de uma dezena de ensaios, é mesmo obrigado a reatar e a repetir pontos de partida, conclusões e relativações presentes em livros anteriores. Se não o fizer, para contento do leitor mais avisado e sociólogo, acabará por cair numa espécie de autismo abjecto em que cada livro se transforma numa mera entidade discreta e mamórea sem um mínimo de fluxo sanguíneo e de vida.