terça-feira, 16 de novembro de 2004

Dois aforismos colados um ao outro

1
Os bárbaros são todos aqueles que não são (falam) como nós?
A própria onomatopeia cartografa já o outro lado de lá da fronteira.
Os estóicos aprenderam no seu tempo que existe uma grande instabilidade e uma razoável elasticidade entre o uso das nossas linguagens e aquilo que queremos exprimir, precisamente porque habitavam nas colónias gregas, local variado e difuso onde as línguas e os hábitos mais diferenciados se misturavam. Eles viam diante dos seus olhos os bárbaros e respiravam com eles a sua filosofia e o modo como esta explicava a significação.
E apesar de tudo, a terra rodava. O culto de qualquer coisa era comum a todos.
2
Existe uma redundância certeira e obviamente irrecusável, quando Wittgenstein afirma que o sentido é aquilo que a explicação do sentido explica. Ou seja, o sentido só se refere àquilo que a partir dele se consegue explicar. Em certos casos é muito mais o que não se consegue explicar do que o que se pode explicar. Há épocas que acolhem esse tipo de casos, dir-se-ia mudos, do mesmo modo que um príncipe recebe a sua desejada princesa. Uma época de terrorismo que opõe uma compreensão primeira do mundo de tipo religioso a uma compreensão primeira do mundo de tipo não religioso é uma época que tende, naturalmente, a coabitar com alguma falta de sentido.
Apesar de tudo a terra roda. E o culto - o sentido do culto - deixou de ser uma respiração comum.