segunda-feira, 21 de junho de 2004

Mudar de casa - 7

Tenho vindo a desenvolver uma possível poética da mudança (de casa). Com algum sucesso. Desse lado (de quem lê) e do lado de cá (atenuando e dissimulando o sufoco natural da situação). Entre uma casa que se deixa (e um número razoável de anos que nela se comungou) e uma nova casa que se (re)construiu de raiz em dez meses de obra vai uma espécie de brecha por onde passa uma luz ténue e sem direcção. Luz dispersa e indefinida, espalhando-se entre o ter sido, o porvir e o acontecimento puro e duro de cada momento, de cada dia. O inesperado a pactuar com a ansiedade adormecida no desejo. O encanto a navegar sobre asas que escondem o imobilismo desencantado dos embrulhos e dos pacotes sem fim. As referências hipotecadas e sem proporção justa de espaço a habitar este estado fluido entre dois continentes, entre dois mares, entre dois céus. Um milagre de metamorfoses absolutamente naturais.