terça-feira, 18 de maio de 2004

Toma lá esta!

Ó Bruno, nascer nos fundos recônditos do Estado Novo tornou-se num pecado? Se alguém, por educação e necessidade, sonhou com a tua metáfora, tão contingentemente cheia de soberba - tomba-gigantes -, foi essa multidão geracional, hoje decadente e maioritariamente céptica, é certo (não é o meu caso), que nasceu ainda na Idade Simbólica em que a arte não passava de um elementar revestimento. A invenção dos nossos pobres saberes, antropológicos ou semióticos, criações um pouco anteriores ao meu nascimento, talvez te bastem (?) para a elaboração dessas montagens rápidas e apaixonadas onde tudo aparece fixado na proporção mais certinha e organizada. Fica bem. Havia um autor (exterior aos nossos paupérrimos domínios) que dizia que nós, humanos, apenas conseguimos ver o ser da coisa e não a mera coisa, desapossada de acto e seus instrumentos (como vês, a consciência da montagem é anterior a Griffith e aos soviéticos). E para esse mesmo autor, a arte correspondia à capacidade de rever as coisas desnudadas e libertas do ser, reposto este na sua verdade e autonomia próprias. Metafísica a mais, eu sei. Mas é isso que eu vejo num rectângulo de jogo. Nada mais. Coisas desnudadas que emocionam. Que nos radicam no inexplicável. Que nos refluem ao essencial. À abertura. Ao cenário onde cada gigante é já um simples sintoma de morte no vir-a-ser da vida. Há uma intemporalidade, ou uma poética de excesso nesta merda toda que me impede a compreensão dessa tua leitura geracional e indutivamente narrativa. À parte os nossos clubes, claro. Cada um com o que merece. Abraço.