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E não é que… Zapatero ganhou as eleições!
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eZapatero disse que ia “começar a dramatizar”. Disse-o sem saber que estava a ser ouvido. E toda a gente ficou muito consternada. Como se isso não fosse a coisa mais normal do mundo. De facto, entre aquilo que um político normalmente diz e aquilo que poderia dizer vai uma certa distância, mas essa distância tem um nome: a realidade.
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Se virarmos o holofote para a nossa própria vida, verificamos que assim é. Repare-se: entre o que vivemos no dia-a-dia e aquilo que conjecturamos ou pressupomos vai a tal distância que nos dá a medida da realidade. O horizonte que nos faz imaginar e prever possibilidades é tão importante como aquilo que nos vai acontecendo momento a momento. A noção de realidade vive deste vaivém ininterrupto, espécie de boomerang que ninguém consegue alterar.
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Só que, quando Zapatero disse o que disse, ficámos subitamente desprovidos do nosso habitual poder de conjecturar ou de pressupor. De repente, vimo-lo a dizer o que teríamos imaginado que ele podia ter dito. Por um momento, o que estava a acontecer e aquilo que podíamos ter pressuposto fundiram-se num único evento. E foi isso que gerou o sobressalto. Ou a consternação. Foi como se a realidade se tivesse tornado numa bofetada.
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Imagine-se que ouvíamos, todos os dias, em “off”, o que Pinto da Costa diz aos seus mais próximos sobre o Apito Dourado, o que Santana diz aos santanistas sobre Menezes, o que Sócrates diz a Silva Pereira sobre Alegre, o que Obama diz à mulher sobre Hillary, o que Blair diz ao Papa sobre Sarkozy ou o que Lula diria a Soares sobre os pastorinhos de Fátima. Não é preciso ter grande veia de dramaturgo para começar a escrever estas vozes, deixas e ‘boquinhas’. Fechamos os olhos e começamos, de imediato, a ouvir a voz de todos estes personagens com cristalina clareza. Mas se os ouvíssemos, tal como ouvimos Zapatero, lá se ia o prazer e lá se ia o nosso poder de celebrar a própria realidade.
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Visto de outro modo: quando se diz, em alto e bom som, o que apenas se imaginaria em privado (um “off” que se torna desconcertantemente “on”), as pessoas riem. É o que as faz ver ao espelho. E é o que as faz desmonstar este jogo sem fim entre o dito e o não dito. O rei de Espanha provou-o frente a Chávez, do mesmo modo que Chávez sempre o provou frente a Bush; João Jardim provou-o frente a Sócrates, do mesmo modo que Berardo sempre o provou a quem quer que fosse. Temperamentos.
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Provavelmente, Zapatero encontraria a vocação de bobo se assim se comportasse; ao invés, apanhado e desprevenido, Zapatero ganhou em revelação e em imaginação. Só que no-las roubou. Restituí-las vai ser obra de dias. Hoje, véspera da campanha eleitoral espanhola, já o teatro das luzes ilumina outras cenas. O povo sempre gostou de lanterna mágica, de truques ópticos, de circo e de cinema com efeitos especiais: ver e deixar de ver ao mesmo tempo. Ser e deixar de ser ao mesmo tempo. Estar “on” e “off”, alternadamente e como modo de vida. Já se ganhou uma eleição por menos.
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Se virarmos o holofote para a nossa própria vida, verificamos que assim é. Repare-se: entre o que vivemos no dia-a-dia e aquilo que conjecturamos ou pressupomos vai a tal distância que nos dá a medida da realidade. O horizonte que nos faz imaginar e prever possibilidades é tão importante como aquilo que nos vai acontecendo momento a momento. A noção de realidade vive deste vaivém ininterrupto, espécie de boomerang que ninguém consegue alterar.
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Só que, quando Zapatero disse o que disse, ficámos subitamente desprovidos do nosso habitual poder de conjecturar ou de pressupor. De repente, vimo-lo a dizer o que teríamos imaginado que ele podia ter dito. Por um momento, o que estava a acontecer e aquilo que podíamos ter pressuposto fundiram-se num único evento. E foi isso que gerou o sobressalto. Ou a consternação. Foi como se a realidade se tivesse tornado numa bofetada.
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Imagine-se que ouvíamos, todos os dias, em “off”, o que Pinto da Costa diz aos seus mais próximos sobre o Apito Dourado, o que Santana diz aos santanistas sobre Menezes, o que Sócrates diz a Silva Pereira sobre Alegre, o que Obama diz à mulher sobre Hillary, o que Blair diz ao Papa sobre Sarkozy ou o que Lula diria a Soares sobre os pastorinhos de Fátima. Não é preciso ter grande veia de dramaturgo para começar a escrever estas vozes, deixas e ‘boquinhas’. Fechamos os olhos e começamos, de imediato, a ouvir a voz de todos estes personagens com cristalina clareza. Mas se os ouvíssemos, tal como ouvimos Zapatero, lá se ia o prazer e lá se ia o nosso poder de celebrar a própria realidade.
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Visto de outro modo: quando se diz, em alto e bom som, o que apenas se imaginaria em privado (um “off” que se torna desconcertantemente “on”), as pessoas riem. É o que as faz ver ao espelho. E é o que as faz desmonstar este jogo sem fim entre o dito e o não dito. O rei de Espanha provou-o frente a Chávez, do mesmo modo que Chávez sempre o provou frente a Bush; João Jardim provou-o frente a Sócrates, do mesmo modo que Berardo sempre o provou a quem quer que fosse. Temperamentos.
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Provavelmente, Zapatero encontraria a vocação de bobo se assim se comportasse; ao invés, apanhado e desprevenido, Zapatero ganhou em revelação e em imaginação. Só que no-las roubou. Restituí-las vai ser obra de dias. Hoje, véspera da campanha eleitoral espanhola, já o teatro das luzes ilumina outras cenas. O povo sempre gostou de lanterna mágica, de truques ópticos, de circo e de cinema com efeitos especiais: ver e deixar de ver ao mesmo tempo. Ser e deixar de ser ao mesmo tempo. Estar “on” e “off”, alternadamente e como modo de vida. Já se ganhou uma eleição por menos.