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sexta-feira, 20 de agosto de 2004

Ficcionalidades de prata – 44


(Staircase, Mexico,Tina Modotti, 1925)

Depois da redenção o que sobeja é apenas a forma. A configuração que se subsume à matéria. O resíduo que escapa à substância. Após a contenda final em torno das crenças e dos mundos cumpridos, nada resiste ao lento labor imaginado nas áleas do paraíso: projectar limites e áreas para que se reimprimam ou dissipem, circuitar o aparato para depurar a extensão em que se aventura, podar a estrutura para que o de dentro e o de fora ilimitadamente se libertem e se cruzem. Tudo isto sem esquecer que é preciso arear a superfície, turvar a claridade, limar os compassos, contrastar as frases, desofuscar as sombras, apurar os tons, contrastar as faces, polir a transparência e reimaginar a sequência. Neste recitativo sem partitura própria, voz que sobe também desce e voz que desce também sobe. Existe no patamar uma junção quase invisível que traduz o zelo desta contradança do espírito: onde dantes ancoravam sonhos, fermentavam idealidades e lustravam verdades, ressurge hoje a beleza denegando a finalidade, a expectativa e a intimidade do próprio zelo. Forma sem formato, encaixe despojado, desenho múltiplo da redenção quotidiana.