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terça-feira, 30 de agosto de 2011

Um poema para o fim do meu mês

e

dá por vezes o corpo como a música dá
a fonte
que não tem

e
a siflar anuncia
o secreto patamar
sem escadarias

e
e o vidro lentamente cose a sombra da calçada
escala a rua e verbera
a mansidão do eco

e
a siflar
dá por vezes a refeição do corpo a tangerinas
ávidas e depois esquece

terça-feira, 23 de agosto de 2011

A Dobra do Crioulinho

PM


e

Acabei o que virá a ser o meu próximo romance - A Dobra do Crioulinho - no último domingo de Julho. Ontem li-o (quase) todo pela primeira vez.

e

Publico aqui, pela primeira vez, um pequeno excerto:

e

"Fiquei à espera, mas por pouco tempo. Tirei uma segunda cerveja do frigorífico e pela janela vi a polícia de choque a atravessar o largo. Atravessaram a calçada como um rio negro que aparece e logo desaparece. Minutos depois o alarme deixou subitamente de se ouvir, mas sentiu-se ao longe um estranho tumulto de vozes. Silvie acordou, não se mexeu e sorriu na minha direcção.
d r
Francisco era um morto vivo a ver uma série que passava – estava sempre a passar – na televisão. Devia ser a Grey. Médicos a retirarem os órgãos a um homem que acabara de morrer na mesa de operações. O LCD não tinha som. Foi nessa altura que Violeta reentrou na sala. Trazia uma bandeja com três chávenas de café. Francisco e Silvie serviram-se. A noite estava cada vez mais quente e eu pensei que o mundo acabaria quando todas as histórias fossem contadas ao mesmo tempo.
d e
A ventoinha estava no máximo e as heras do alpendre tinham regressado a si: a serenidade das marcas. O vento desaparecera. Afastei com os dedos o cortinado e revi a calçada vazia. A geometria é a repetição de uma ideia simples, apenas isso. Violeta veio colocar-se a meu lado. O tumulto de vozes ao longe impressionava. Olhei para Violeta e senti-me a andar no descapotável. Bastava olhar para ela e estávamos os dois já a andar de carro. O desejo é um ser. Fora do desejo não há tempo. Apenas gravitas. E esta sala era um gravitas perfeito."