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O frisson épico
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Por trás do cenário da presidência portuguesa da UE, o país anda encantado com as Sete Maravilhas (do mundo, do país, tanto faz!). A discussão é frívola, atravessa sem grande ruído regionalista – felizmente – o nosso breviário de costumes e irá acabar naquilo que, hoje em dia, se designa por “grande evento”. Pouca importa a designação e o teor do “grande evento”, pois o que nele conta é a comunicação pela comunicação, o impacto da simulação mundializada e o aparecimento em rede de algumas figuras (ou fantasmas?), cujo êxtase reside nessa aparição e não, claro, no que proferirem, cantarem ou ajuizarem.
Por trás do cenário da presidência portuguesa da UE, o país anda encantado com as Sete Maravilhas (do mundo, do país, tanto faz!). A discussão é frívola, atravessa sem grande ruído regionalista – felizmente – o nosso breviário de costumes e irá acabar naquilo que, hoje em dia, se designa por “grande evento”. Pouca importa a designação e o teor do “grande evento”, pois o que nele conta é a comunicação pela comunicação, o impacto da simulação mundializada e o aparecimento em rede de algumas figuras (ou fantasmas?), cujo êxtase reside nessa aparição e não, claro, no que proferirem, cantarem ou ajuizarem.
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Mas não se pense que as designações são coisas vãs. Na maior parte das vezes, ao designar, quer o plebeu quer o nobre significam muito para além do que desejariam. Por exemplo, quando Durão Barros invocou solenemente "Bartolomeu Dias" e "Vasco da Gama", no Dia Um da presidência portuguesa (para significar a Alemanha e Portugal), o artifício disse bem mais a seu respeito (e da Comissão) do que acerca do Tratado do Éden. O cariz heróico, mobilizador e entusiástico, subjacente às “Descobertas” de Durão Barroso (e omnipresente no vocabulário oficial), contrastou com um óbvio alheamento do público.
Mas não se pense que as designações são coisas vãs. Na maior parte das vezes, ao designar, quer o plebeu quer o nobre significam muito para além do que desejariam. Por exemplo, quando Durão Barros invocou solenemente "Bartolomeu Dias" e "Vasco da Gama", no Dia Um da presidência portuguesa (para significar a Alemanha e Portugal), o artifício disse bem mais a seu respeito (e da Comissão) do que acerca do Tratado do Éden. O cariz heróico, mobilizador e entusiástico, subjacente às “Descobertas” de Durão Barroso (e omnipresente no vocabulário oficial), contrastou com um óbvio alheamento do público.
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Apesar da propensão geral para os “grandes eventos”, é curioso como o capricho metafórico dos Descobrimentos nos persegue. E nos mascara. Devo dizer que, com os meus dez ou onze anos, já brincava à Infante D. Henrique nas poças da chuva. Com quinze, deitava caravelas no Rio Nabão e sentia um frisson épico que não desonrava as lendas domésticas sobre o Mundo Português, os êxtases pessoanos ou a eloquência em verso de Garrett sobre Camões. Estávamos todos já em rede: eu, as “Lendas e Narrativas” e ainda um delirante reitor do então Liceu Nacional de Évora que dava animadas aulas sobre o “Quinto Império”. Um dia, como sabemos, veio a XVIIª precedendo o augurado paraíso da Expo-98. “Foi assim”, parafraseando Zita Seabra: as alucinações comemorativas e as metáforas do nosso destino sempre adoraram voltar ao local do crime: à gesta dos Descobrimentos (Ai, Ai, “Sete Maravilhas”!). Como um ratinho a pedalar numa redoma de plástico. Como um passarinho a debicar na ameixa (mais do que) madura. Como um insípido episódio, às esquerdas ou às direitas, sempre a rimar consigo mesmo. Sempre.
Apesar da propensão geral para os “grandes eventos”, é curioso como o capricho metafórico dos Descobrimentos nos persegue. E nos mascara. Devo dizer que, com os meus dez ou onze anos, já brincava à Infante D. Henrique nas poças da chuva. Com quinze, deitava caravelas no Rio Nabão e sentia um frisson épico que não desonrava as lendas domésticas sobre o Mundo Português, os êxtases pessoanos ou a eloquência em verso de Garrett sobre Camões. Estávamos todos já em rede: eu, as “Lendas e Narrativas” e ainda um delirante reitor do então Liceu Nacional de Évora que dava animadas aulas sobre o “Quinto Império”. Um dia, como sabemos, veio a XVIIª precedendo o augurado paraíso da Expo-98. “Foi assim”, parafraseando Zita Seabra: as alucinações comemorativas e as metáforas do nosso destino sempre adoraram voltar ao local do crime: à gesta dos Descobrimentos (Ai, Ai, “Sete Maravilhas”!). Como um ratinho a pedalar numa redoma de plástico. Como um passarinho a debicar na ameixa (mais do que) madura. Como um insípido episódio, às esquerdas ou às direitas, sempre a rimar consigo mesmo. Sempre.