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quarta-feira, 27 de junho de 2007

Pré-publicações - 39

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Jacques Lanzmann, O Império do Silêncio, Publicações Europa-América, Mem Martins, 2007 (Julho)
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Pré-Publicação:
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"Ao longe, o caminho que serpenteava entre as mais altas dunas. Por vezes perdia-se de vista mas logo depois tornava-se de novo visível. Estava assinalado por bandeirolas, vasilhas enterradas até meio, destroços de camiões, pneus, portas ou capôs, colocados entre si a uma distância regular. Para completar este cenário alucinatório, estacas enormes, refractárias às piores intempéries, erguiam-se em direcção ao céu, como varas que ameaçassem a mais pequena nuvem com um suplício horrível.
As caravanas passavam entre o ferro-velho e as estacas. Quando se perfilavam ao largo de Garame, não prestavam atenção aos castelos desmesurados repletos de grés, nascidos de uma série de caprichos sísmicos. A erosão, as tempestades, a mitologia animista tinham-se encarregado do resto. O medo, os rumores, faziam com que ninguém parasse diante de Garame. Quer fossem num sentido ou noutro, os séquitos apressavam o passo. Homens e animais baixavam a cabeça. Tanto os mais velhos como os mais jovens estugavam o passo à mais ténue visão do oásis. Ninguém falava mas toda gente pensava nas terríveis provações que poderiam afligi-los eternamente. O melhor era evitar provocar a fúria dos espectros. Então, corriam, avançavam com o pretexto do atraso da caravana. A esse ritmo, a água ia escassear.
A montante de Garame, o poço mais próximo situava-se a quatro dias de marcha. A jusante, o primeiro ponto de água, frequentemente seco, ficava a cinco dias de viagem. E, mais uma vez, também aqui era necessário encurtar o tempo de descanso, esquecer as noites ao relento, aproveitar ao máximo a frescura nocturna. Avançar, sempre a direito, sob o caminho das estrelas.
Barski ainda se sentia surpreendido. Era o único a saber da existência do guelta que cobria o fundo do desfiladeiro. Outrora, dava de beber e irrigava o povoado. Hoje em dia, turvo e estagnado, assassinava o seu único ocupante. Água é água! Que importa que seja pura ou impura, água tratada ou envenenada. O sedento precipita-se sobre ela com vontade e violência. Resiste-se à fome, à sede não. Não se comem as carcaças porque fedem, porque fervilham de larvas. Em contrapartida, lançamo-nos sem hesitação sobre um charco imundo, chafurdamos no pior dos lodaçais.
Aqueles que se cruzavam ao largo de Garame — caravaneiros, camionistas, guias, desertores, viajantes perdidos — não suspeitavam de forma alguma da existência deste guelta. E mesmo que a ideia lhes viesse ao espírito, como a água vem à boca, teriam ainda de enfrentar os demónios e os djinns, que a lenda dos séculos faz coabitar neste canto maldito, entre as ossadas de uma população outrora pestilenta.
Barski constatava este facto todos os dias. Passa-se diante de Garame como quem percorre a garganta de uma montanha, com os ombros encolhidos, os olhos fixos no chão. Aqui, porém, não há garganta alguma nem cumes vertiginosos susceptíveis de impressionar os nómadas.
Diante de Garame e até ao horizonte, nada excepto um vasto planalto desértico, fileiras de dunas até ao infinito, nas quais vinha perder-se o caminho coberto de indicações, de tótemes da fortuna."
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