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quarta-feira, 21 de fevereiro de 2007

Blogues e Meteoros - 18

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(a partir de ontem no Expresso online)
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A liberdade e a escrita: literatura e blogues
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Uma pessoa pode ser livre e sentir-se livre, mas se veste o anoraque de escritor deixa imediatamente de o ser. Um escritor está sempre condicionado por uma forma que é a literária e por um universo que dita regras e eficácias de todo o tipo (técnicas, comunicacionais, hermenêuticas, etc.). No entanto, esses limites reais à liberdade é que acabam, paradoxalmente, por construir o horizonte de liberdade que o escritor pode, ou não, usufruir. Esse usufruto é afinal a sua liberdade. E quanto mais o escritor se sentir livre para contornar as narrativas que ‘andam no ar’ (aqueles ‘valores gerais’ – políticos, meramente ideológicos ou de “auto-ajuda”, como agora se diz – que são respostas para tudo), mais esse paradoxo da sua liberdade se torna eficaz e mais as vozes criadas pelo escritor serão tendencialmente vozes livres e, portanto, à procura de sentido.
A liberdade não é um presente que se receba do céu. É antes uma disposição individual e um entendimento geral que se poderão rever um ao outro no mútuo usufruto dos actos do quotidiano. A literatura é um desses actos, como qualquer outro. Pelo meu lado, nunca sacralizei a actividade, nem tão-pouco a entendi como particularmente “libertadora” no sentido de poder estar ao serviço de “causas”. É aí que ela, precisamente, deixa de ser usufruto para passar a não ser livre. Para passar a ser narrativa enclausurada em narrativa. Grande parte da história da literatura, do século XVIII para cá, foi feita nesta ou a partir desta clausura. E sem que ninguém sublinhasse o facto, ou pelo menos a importância que ela releva.
Nos blogues, a questão da escrita, em si, não é substancialmente diferente. O que muda é a provisoriedade (as formas em estado de permanente subtracção e adição), a enunciação síncrona e plural, a metacontextualidade (as formas criam o seu próprio contexto, deixando de haver um “de fora” e “um de dentro” evidentes), a reversibilidade (multimodalidade e coexistência de registos) e o incorpóreo (no sentido de um agregado que não é motivado por um centro mas por vários). O que muda é ainda e sobretudo a posição relativa entre escritor e auditórios, assim como o tipo de interacção que, na comunicação literária, acede ao estético e que, nos blogues, apenas acede à “estesia” (a simultaneidade entre a pura sinalização e um certo regresso ingénuo à poiesis: a linguagem que joga com a linguagem).
Seja como for, a liberdade nos blogues continua a não ser uma coisa oferecida. É o usufruto radical de um acto de escrita, no perpétuo pas de deux com os limites desse mesmo acto, que melhor escrutina e define a liberdade. Ela – a liberdade – estará sempre lá, potencialmente, como um gesto lapidar, ou insignificante, que pode ou deve avançar para além do corpo.