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Os blogues criam todos os dias milhões de conteúdos que percorrem o jogo de espelhos do novo labirinto da rede. Nas conectividades que a estendem para fora e para dentro de si, os discursos fluem através de links, de pontes entre excertos, de partilhas entre dados e, em termos mais gerais, através da propagação metonímica de escritas variadíssimas que recobrem a comunidade (cada vez mais globalizada). A expressão da blogosfera é ainda uma tentativa de ocupação de um espaço, embora à ideia de descoberta de um novo território se sobreponha quase sempre a ilusória convicção de um dial-up automático e normalíssimo (tais são os efeitos da instantaneidade). É como se os navegadores de quinhentos chegassem a novos continentes e se exprimissem, depois, como se nada tivesse acontecido: mera conectividade. Esta neutralização da aventura expressiva (e da posse dos seus objectos) que está ‘em curso’ é típica da revolução pacífica que os blogues protagonizam nos nossos dias (só mentes tão inquinadas quanto criteriosas, caso de Clara Ferreira Alves, podem ver no novo medium um refúgio para "desempregados", "ociosos" e "rancorosos"*).
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Os média tradicionais, de modo diverso do que acontece com o discurso publicitário e com as “RP” em geral, tudo fazem, ainda que involuntariamente, para preservar um tipo de representação baseada sobretudo no fechamento (relação estrita entre fontes variadas e impressão) e, por isso, dissociado do imaginário da rede. A própria extensão dos média tradicionais aos meios “on-line” confirma essa tendência conservadora, na medida em que os conteúdos aí agenciados dispensam geralmente os “links” e acabam por assumir-se como atributos, marcas indexicais ou simples “suplementos” do suporte em papel.
Poderão alguns cair na tentação de ‘denunciar’ estes factos projectando nos média tradicionais um 'dever ser' que não é o da sua genuína codificação. De qualquer modo, imaginar que os jornalistas pudessem agir como os “bloggers” agem, ou seja, de um modo aberto e multimodal no coração da rede, seria, de algum modo, imaginar a morte da própria ideia (moderna) de jornalista. Imaginá-lo pressuporia um nivelamento da iniciativa diária e profissional dos jornalistas com os mais anónimos nós que constituem a rede. Imaginá-lo pressuporia uma menor visibilidade do seu próprio juízo deontológico e, portanto, da auto-referencialidade activa que lhes é particularmente inerente. Imaginá-lo pressuporia uma menor presunção do seu papel de tradutores exclusivos das meta-ocorrências (que constroem mundo) perante o grande público.
Exigir aos jornalistas uma natureza que não é a sua é legítimo, mas talvez não seja tão profícuo quanto se possa crer. No fundo, a verdade é que a comunicação não é apenas um vínculo estrito dos jornalistas (é esse o pensamento falacioso dos muitos jornalistas que são euforicamente chamados às escolas de comunicação para os estágios práticos de fim de curso). A própria – e recente – tradição da epistemologia comunicacional o demonstra, já que as saídas práticas desses estudos apontam, para além do clássico jornalismo, para o multimédia, para as relações públicas, para o marketing, para a investigação e para outras dimensões variáveis que colocam em evidência a proximidade entre a cultura material, o design e os novos mitos hipertecnológicos do globário.
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A comunicação está, pois, muito para além do jornalismo e seria um erro imputar-lhe uma espécie de pesada mono-referencialidade (daí que palavras, como as de Clara Ferreira Alves, não tenham qualquer importância). Se existe alguma ética e algum 'dever ser' na comunicação contemporânea, ela não é com toda a certeza uma anfitriã exclusiva e sedentária das redacções dos jornais. É o que estamos, também, no dia a dia, a aprender humildemente nos blogues, essa bacteriologia espalhada na rede que tem adaptado e desenvolvido as suas capacidades expressivas a um devir não apenas jornalístico da comunicação. Daí, também, a sua virtude e a sua imensa riqueza potencial.
A conquista de um “tom” específico, ou seja, a reinvenção de linguagens e elocuções no novo território da rede, é, hoje em dia, um novíssimo laboratório comunicacional onde – ao contrário dos média tradicionais - os blogues se tornaram personagens essenciais (experimentais) e globais.
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Os média tradicionais, de modo diverso do que acontece com o discurso publicitário e com as “RP” em geral, tudo fazem, ainda que involuntariamente, para preservar um tipo de representação baseada sobretudo no fechamento (relação estrita entre fontes variadas e impressão) e, por isso, dissociado do imaginário da rede. A própria extensão dos média tradicionais aos meios “on-line” confirma essa tendência conservadora, na medida em que os conteúdos aí agenciados dispensam geralmente os “links” e acabam por assumir-se como atributos, marcas indexicais ou simples “suplementos” do suporte em papel.
Poderão alguns cair na tentação de ‘denunciar’ estes factos projectando nos média tradicionais um 'dever ser' que não é o da sua genuína codificação. De qualquer modo, imaginar que os jornalistas pudessem agir como os “bloggers” agem, ou seja, de um modo aberto e multimodal no coração da rede, seria, de algum modo, imaginar a morte da própria ideia (moderna) de jornalista. Imaginá-lo pressuporia um nivelamento da iniciativa diária e profissional dos jornalistas com os mais anónimos nós que constituem a rede. Imaginá-lo pressuporia uma menor visibilidade do seu próprio juízo deontológico e, portanto, da auto-referencialidade activa que lhes é particularmente inerente. Imaginá-lo pressuporia uma menor presunção do seu papel de tradutores exclusivos das meta-ocorrências (que constroem mundo) perante o grande público.
Exigir aos jornalistas uma natureza que não é a sua é legítimo, mas talvez não seja tão profícuo quanto se possa crer. No fundo, a verdade é que a comunicação não é apenas um vínculo estrito dos jornalistas (é esse o pensamento falacioso dos muitos jornalistas que são euforicamente chamados às escolas de comunicação para os estágios práticos de fim de curso). A própria – e recente – tradição da epistemologia comunicacional o demonstra, já que as saídas práticas desses estudos apontam, para além do clássico jornalismo, para o multimédia, para as relações públicas, para o marketing, para a investigação e para outras dimensões variáveis que colocam em evidência a proximidade entre a cultura material, o design e os novos mitos hipertecnológicos do globário.
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A comunicação está, pois, muito para além do jornalismo e seria um erro imputar-lhe uma espécie de pesada mono-referencialidade (daí que palavras, como as de Clara Ferreira Alves, não tenham qualquer importância). Se existe alguma ética e algum 'dever ser' na comunicação contemporânea, ela não é com toda a certeza uma anfitriã exclusiva e sedentária das redacções dos jornais. É o que estamos, também, no dia a dia, a aprender humildemente nos blogues, essa bacteriologia espalhada na rede que tem adaptado e desenvolvido as suas capacidades expressivas a um devir não apenas jornalístico da comunicação. Daí, também, a sua virtude e a sua imensa riqueza potencial.
A conquista de um “tom” específico, ou seja, a reinvenção de linguagens e elocuções no novo território da rede, é, hoje em dia, um novíssimo laboratório comunicacional onde – ao contrário dos média tradicionais - os blogues se tornaram personagens essenciais (experimentais) e globais.
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*Publicado pela cronista no Diário Digital e referenciado no desdobrável da Casa Fernando Pessoa que convoca o público para uma discussão sobre este mesmo tema a ter lugar hoje, pelas às 21h. 30 (com a presença de Eduardo Prado Coelho - que "não lê blogues" -, Fernanda Câncio, Pedro Mexia e a moderação habitual de Carlos Vaz Marques). Antes do debate, Vasco Santos da editora Fenda falará dos livros que gostaria de ter editado no último mês e Maria Antónia Oliveira tentará responder à seguinte questão: Alexandre O'Neill, se fosse vivo, teria um blogue?