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terça-feira, 27 de dezembro de 2005

BI de Maria Filomena Mónica - 1

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O interesse de um livro também se mede pelo ímpeto com que move e cativa o leitor. Mesmo que se revele abaixo das expectativas, um livro pode colar, ou não, com uma espécie de indução narrativa que está sempre pronta a recolocar o agenciamento, a intriga e, portanto, os destinos possíveis que estão em jogo. Um livro pode até dizer-nos qual a latitude entre a soberba e a humildade com que a sua escrita terá sido engendrada, sem que, com isso, deixemos de rescrever, com algum prazer, cada passo, cada rosto, ou cada rua mais anónima que apareça descrita. Um livro pode gerar empatias e comoções, ou passar despercebido entre mil e um acenos que dão a ver, ao longe, a emoção que passou ao lado. Um livro pode ser útil ao gender, à radiografia pontual de uma comunidade, à depurada fruição de um enredo, à plasticidade do que se diz, ou a nada. Um livro pode adormecer na banca de cabeceira e murmurar-nos, ou não - a nós, leitores - acerca da sua presença durante o tempo que medeia a leitura. Um livro pode incendiar a alma e obrigar-nos a descobrir uma silhueta perdida no calor da nossa memória mais involuntária. Um livro pode dizer-nos os nomes de pessoas reais ou de personagens inventados, sem que isso remeta para realidades verificáveis ou "autorizadas"; no fundo, é o pressentido labirinto das imagens que acaba por trazer ao ser o mundo que faz um nome ser um fantasma, uma figura ou um esboço de pessoa. Um livro que se afirme autobiográfico já nos diz, à partida, que a ficção pretende regressar do esboço imaginário ao perímetro mais preciso de uma experiência que se revê num nome, numa percurso e numa montagem que se quer ver a si própria encenada. Um livro autobiográfico que se diga de si mesmo ser pioneiro (ou que tão-só o sugira em subtexto para que o metatexto e a crítica pública que o sucedem o definam enquanto tal) pode tornar-se algo artificioso. Resumindo: um livro que consiga motivar o leitor, que consiga engendrar com nitidez o espaço de um trajecto, que consiga retratar (com elipses diversas do habitual no meio em que é difundido) a avidez da superação e que, por fim, consiga habilmente dizer de si mesmo ser outro... pode ser um bom livro. Não sei se será, neste caso, mas já li mais de metade. E vou embalado.
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(Um texto de blogue é livre: permite andar à procura do que se quer dizer. Um texto autobiográfico é-o muito menos: permite andar à procura de uma imagem que se quer repor)
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(No início do Verão de 2004, comecei a reunir material para escrever a biografia inventada de uma personalidade muito conhecida e já falecida há umas três décadas. No entanto, o tipo de pesquisa e a incerteza das metas a atingir, acabaram por desmobilizar-me. Porquê?)
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(Curiosamente, o Balanço que o Francisco está a fazer tem muito a ver com o espírito "Bilhete de Identidade", embora muito mais incisivo e sem aquelas "elipses", mas com as outras que também não se esperavam; daí o interesse e, já agora, a oportunidade.)