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quarta-feira, 30 de março de 2005

UM AMOR CATALÃO
Folhetim à moda clássica
VIGÉSIMO SEXTO EPISÓDIO
(A incompleta redenção de Veneza)

Albe regressa a S. Marcos a sós.
Tudo ali se passou. É esse precisamente o nome da ausência. O devaneio do passado transformado em imaginação. Ou em delírio colado à ilusão de uma calma infinita.
Foi Edmundo que não apareceu e foi o violinista que, de viagem, já regressou a Milão.
Albe prepara-se agora para regressar a Paris, mas antes tudo faz por colocar os pés em terra e desvendar a serenidade com que, de vez em quando, os dois mouros se fazem ouvir na torre do relógio, entre S. Marco e a Calle Carppetto Nero.
Como se fosse bruma nocturna em pleno dia, a poderosa Senhoria que se ergue no topo de San Giorgio Maggiore, não só avista a involuntária solidão de Albe como parece anunciar a repentina claridade que desceu sobre a cidade.
E Albe, talvez menos inconsolada, só já pensa no iminente regresso a Paris: é a hora do comboio que se aproxima, são as bagagens, são os passos sem rumo e toda, toda a memória do Verão por remover-se. A esconder-se. A enterrar-se numa dor sem forma.
Ao entrar na Gare, o céu voltou de novo a coar e a chuva apareceu abruptamente.
Tudo na cidade se liquefaz, de um momento para o outro.
Depois o comboio deslizou com suavidade e partiu.
Rejuvenescida de uma perfeição inquieta, Veneza despede-se agora de Albe com os seus fios de ouro, com os seus vidros de jade, com a sua luz disforme e irradiante, com a sua voz de incompleta redenção.


(No próximo episódio, Edmundo, regressado a Lisboa, parece querer tomar uma decisão definitiva sobre o rumo a dar à sua vida)

Continua