Divertimentos – 2
Eu bem disse que a vida política dos próximos tempos nos ia dar momentos de muito boa disposição. Mas para tal é preciso ser-se um observador estóico e não muito impressionável com as desventuras do imediatismo político, mais inofensivas pelo bluff panfletário que comportam, do que pela sina de real ameaça que muitos propalam dramática e arrepiadamente (como se não estivéssemos, afinal, em democracia e, portanto, em concertada e pública vigilância). O dramatismo e o arrepio fazem parte dos programas políticos cuja estratégia é a auto-subsistência pura e onde se manuseia, de modo vibrátil, um discurso do tudo ou nada visando um público que possa dar-se conta de que ainda existe um locutor (partidário) que está vivo e que o consegue proferir.
Mas vamos às graçolas de hoje (e… são três):
a) É ver Santana Lopes a querer descer o IRS (gostava de ter visto a cara de Manuela Ferreira Leite nessa altura), já que os respectivos efeitos só se sentirão em 2005 (ano de eleições) se a medida for tomada este ano. Depois, lá veio o socialista Constâncio dizer que era mas era preciso ter juízo. E quem soube ler a simetria invertida deste acto único deve ter-se rido. Pois claro, convergência é convergência.
b) É ver Paulo Portas a defender as intrínsecas qualidades de Nobre Guedes para a pasta do ambiente com o seguinte argumento: O PP é um partido “que defende a vida”, logo é um “partido que defende a natureza”. Trata-se, como se vê, de um silogismo perfeito, de tal modo que, na premissa primeira, reenvia, com subtileza plebeia, quase todos os outros partidos para a defesa da morte. Como é óbvio e não podia deixar de ser. Para além do que diz, Portas sabe manter como poucos aquele ar de ilustre actor que trata a naturalidade com a mesma tosca desinibição com que endereça um brevíssimo olhar lateral para a câmara da televisão. Uma maravilha mitológica.
c) É ver, por fim, Morais Sarmento a afirmar que "este Governo não tem que responder pelas suficiências ou insuficiências do anterior". Já toda a gente sabia que a coligação mudou e que as naturezas em jogo eram radicalmente outras. Agora aparecem coligados o PP teórico e fatiótico (o prático ficou no Marco e na bela Ponte de Lima), a Força Santana em número razoável (PPD/FS), alguns Cindidos do Cavaquismo (PSD/CC), um ou outro Loureirista Contido (PSD/LC) e ainda algum Barrosismo remanescente (PSD/MR). No PSD real, as oposições são de monta e variadas. Escuso de exemplificar.