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sábado, 27 de setembro de 2003

Lógicas da memória

É nos seus Paraísos artificiais que Charles Baudelaire (na secção Un mangeur d´opium/ Visions d´Oxford, I, Le palimpseste) compara o cérebro humano a um autêntico "palimpsesto". Este seria composto por uma série de camadas (“des couches”) de ideias, de imagens e de sentimentos que sucessivamente se acamam de modo tão leve como a luz. Tudo se passa, nesta descrição caleidoscópica, como se cada camada do nosso cérebro devorasse (“ensevelissait”) a anterior, embora, na verdade, todas elas continuem vivas e presentes.
Este "palimpsesto" da memória humana apresenta, segundo a visão do poeta, dois níveis completamente distintos. Num primeiro patamar, coabitaria o caos fantástico e grotesco em permanente colisão com “elementos heterogéneos”; num segundo patamar, a fatalidade “du tempérament” seria antes levada a harmonizar os elementos que, à partida, se pudessem considerar verdadeiramente opostos ou irreconciliáveis.
Acrscenta ainda Baudelaire que, se pudéssemos dar voz simultânea aos variadíssimos ecos da memória que transportamos, então decerto que ouviríamos um "concerto, agradável ou doloroso, mas aparentemente lógico e sem dissonâncias".