segunda-feira, 5 de janeiro de 2004

Ainda a agenda

A chamada "agenda" (noticiosa, política, tanto faz) é um instrumento lexical recente. Serve para nos delimitar, com alguma precisão, as coisas em que devemos pensar e as coisas que devemos ouvir e ver (os chamados "conteúdos"). No fundo, a "agenda" resume-se a um conjunto de instruções que tende a edificar um mundo fechado sobre si próprio e que conteria em si todas as referências possíveis do nosso discorrer. Sem ter em conta que o complexo discorrer em que comunicamos (ou através do qual somos comunicados) é um vaivém muitíssimo mais irradiante e livre. Em tempo de rede, as tentativas de impedir a cultura do linque ilimitado são interessantes. Vendem-nos o fluxo e a indiferença e tendem a esquecer que a democracia é um habitat de indagação de todos os percursos possíveis. E o possível, repita-se e registe-se, não é apenas o construído, o dito, o agendado.
Só um apogeu trágico do hiper-terrorismo poderia, um dia, legitimar uma dada cultura da "agenda".